Lisboa em velocidade cruzeiro
Apesar de grandes incertezas sobre a guerra na Ucrânia, o porto de Lisboa tem previsto para 2022 um recorde de 358 escalas de navios de cruzeiro. Treze são paquetes portugueses

Um elegante paquete, com os olhos brilhantes e um sorriso estampado na proa, afastou-se lentamente do cais e embicou para a barra, deixando para trás Alfama, com os seus prédios tão estreitos, desiguais e coloridos. Uma hora depois, já senhor dos seus nervos, já na posse de todos os seus meios de navegação, passou silenciosamente pelo farol do Bugio antes de desaparecer na imensidão do oceano.
O porto de Lisboa é um dos mais procurados por grandes paquetes de todos os géneros e feitios por se encontrar na parte mais ocidental da Europa, tornando-o a escala ideal entre o Velho e o Novo Mundo.
Desde os finais do século XIX que Lisboa era visitada regularmente por navios que faziam viagens de cruzeiro, expressão que remonta a 1650 e deriva da palavra holandesa kruisen, que significa, “navegar de um lado para outro sem se dirigir a nenhum porto específico”. Os benefícios para a saúde das viagens de mar associadas à vontade de viajar por puro prazer elevou este conceito para outro patamar. Claro que este tipo de viagens estava reservado às classes mais abastadas.
“A crise de 1929, também conhecida como Grande Depressão, atingiu duramente os navios de passageiros, que foram obrigados a começar a fazer cruzeiros para se manterem em atividade. Os prazeres reservados apenas a ricos tornou-se a atração e o sonho de muitos europeus que tanto desejavam poder realizá-lo”, conta o historiador da marinha mercante, Luís Miguel Correia,um apaixonado pelo mar. Com apenas dois anos embarcou no “Vera Cruz”, aos quatro no “Santa Maria”, aos 18, um amigo emprestou-lhe uma câmara Olympus, começou a fotografar e não parou até hoje. Já perdeu a conta de todos os navios onde entrou, mas tem bem presente as histórias de cada navio.

Os primeiros excursionistas
A 29 de janeiro de 1931, o paquete “Lourenço Marques”, da Companhia Nacional de Navegação anunciou a sua partida da velha cidade de Ulisses com um retumbar rouco vindo das suas entranhas de aço, depois passou tranquilamente por onde as naus estiveram outrora, em direção ao Atlântico. A bordo levava os primeiros excursionistas portugueses para uma viagem até ao Rio de Janeiro para assistirem ao carnaval.
Dois anos mais tarde, o ACP (Automóvel Clube de Portugal) inicia a prática turística do cruzeiro com uma viagem de dez dias pelo Funchal, Casablanca e Tânger. À largada do “Quanza”, milhares de serpentinas lançadas de bordo ligaram por algum tempo os excursionistas a centenas de pessoas que se haviam deslocado ao cais para se despedirem. Depois, pouco a pouco, o paquete embandeirado afastou-se da muralha sob revoadas de lenços agitados pela brisa da tarde.
Ao fim de dois dias derreteu o gelo entre os ilustres excursionistas desconhecidos (magistrados, médicos, advogados, militares, comerciantes e industriais) e estabeleceu-se um ambiente de cordialidade e simpatia. Formaram-se pequenos grupos que cavaqueavam animadamente no tombadilho e a piscina improvisada mal continha o formigar constante dos nadadores. Os vários jogos e passatempos a bordo mantiveram os passageiros permanentemente ocupados. Ao chegar a Lisboa, frente a Belém realizou-se uma pequena cerimónia para festejar a viagem. Em homenagem ao comandante abriram-se algumas garrafas de vinho do Porto e fez-se um brinde ao prestigiado marinheiro.
Em 1935 a revista “O Mundo Português”, órgão da Sociedade de Propaganda Nacional, organizou o primeiro cruzeiro de férias às colónias. A 10 de agosto o velho e ronceiro “Moçambique” saiu do Cais da Fundição (atual Terminal de Cruzeiros de Lisboa), para uma viagem inefável cheia de exotismos e fascínios. A bordo, 250 excursionistas, principalmente estudantes, foram conhecer a grandeza do nosso Ultramar. A parte cultural do cruzeiro foi incumbida ao professor Marcello Caetano, da Universidade de Lisboa, que elaborou um intenso programa de preleções, conferências e palestras durante a viagem. Foi um banho de portuguesismo para todos.
Nos anos 30, o Governo alemão, liderado por Hitler, usou os cruzeiros como forma de recompensa e de incentivo aos membros do partido nazi. Esta iniciativa constituiu um marco na história da indústria de cruzeiros, tornando as viagens disponíveis e muito acessíveis para a classe média. Muitos dos navios da “Kraft durch Freude” (Força pela Alegria) faziam escala em Lisboa, por vezes vinham dois ou três juntos e tinham direito a fogo de artifício no bonançoso Tejo. “Quando os turistas alemães desembarcavam, havia no portaló uma saca com moedas de dez escudos, dinheiro que o Estado dava a cada passageiro para poder gastar em terra”, conta o historiador.
Em breve, Lisboa tornar-se-ia o único porto livre e neutral da Europa, transformou-se em sala de espera de todos aqueles que procuravam fugir dos campos beligerantes do Velho Continente. Terminada a II Guerra Mundial, Salazar apostou no turismo como motor do desenvolvimento económico e o movimento marítimo de passageiros no porto de Lisboa, entretanto dotado com duas amplas e modernas estações marítimas, começou a registar um apreciável aumento de ano para ano.
Mas uma ameaça pairava no céu. O vertiginoso progresso dos tempos modernos criou, entre outras maravilhas, o avião, voando de um continente para outro e encurtando a duração das viagens. Seria o transatlântico expulso do mar?
Portugal não sentia a pressão do grande pássaro de metal. Ainda era mais barato atravessar o Atlântico de navio do que de avião e o tráfego marítimo intensificava-se. Paquetes como o “Pátria”, o “Império” e o “Uíge” faziam a carreira de África e o “Vera Cruz” e o “Santa Maria” faziam a carreira da América do Sul. Os dois últimos ofereciam cruzeiros de fim de ano à Madeira, para assistir ao inesquecível fogo de artifício. A origem deste festival de cores remonta a 1866 mas foi o hotel Reid’s que em 1924 organizou um espetáculo concentrado no anfiteatro da capital madeirense. A apoteose pirotécnica que assinalou a chegada do novo ano ultrapassou todas as expectativas perpetuando a tradição.

Partida do paquete "Moçambique" do Cais da Fundição em 1935 (foto: Hemeroteca Digital)
Partida do paquete "Moçambique" do Cais da Fundição em 1935 (foto: Hemeroteca Digital)
Os primeiros excursionistas
A 29 de janeiro de 1931, o paquete “Lourenço Marques”, da Companhia Nacional de Navegação anunciou a sua partida da velha cidade de Ulisses com um retumbar rouco vindo das suas entranhas de aço, depois passou tranquilamente por onde as naus estiveram outrora, em direção ao Atlântico. A bordo levava os primeiros excursionistas portugueses para uma viagem até ao Rio de Janeiro para assistirem ao carnaval.
Dois anos mais tarde, o ACP (Automóvel Clube de Portugal) inicia a prática turística do cruzeiro com uma viagem de dez dias pelo Funchal, Casablanca e Tânger. À largada do “Quanza”, milhares de serpentinas lançadas de bordo ligaram por algum tempo os excursionistas a centenas de pessoas que se haviam deslocado ao cais para se despedirem. Depois, pouco a pouco, o paquete embandeirado afastou-se da muralha sob revoadas de lenços agitados pela brisa da tarde.
Ao fim de dois dias derreteu o gelo entre os ilustres excursionistas desconhecidos (magistrados, médicos, advogados, militares, comerciantes e industriais) e estabeleceu-se um ambiente de cordialidade e simpatia. Formaram-se pequenos grupos que cavaqueavam animadamente no tombadilho e a piscina improvisada mal continha o formigar constante dos nadadores. Os vários jogos e passatempos a bordo mantiveram os passageiros permanentemente ocupados. Ao chegar a Lisboa, frente a Belém realizou-se uma pequena cerimónia para festejar a viagem. Em homenagem ao comandante abriram-se algumas garrafas de vinho do Porto e fez-se um brinde ao prestigiado marinheiro.
Em 1935 a revista “O Mundo Português”, órgão da Sociedade de Propaganda Nacional, organizou o primeiro cruzeiro de férias às colónias. A 10 de agosto o velho e ronceiro “Moçambique” saiu do Cais da Fundição (atual Terminal de Cruzeiros de Lisboa), para uma viagem inefável cheia de exotismos e fascínios. A bordo, 250 excursionistas, principalmente estudantes, foram conhecer a grandeza do nosso Ultramar. A parte cultural do cruzeiro foi incumbida ao professor Marcello Caetano, da Universidade de Lisboa, que elaborou um intenso programa de preleções, conferências e palestras durante a viagem. Foi um banho de portuguesismo para todos.

Partida do paquete "Moçambique" do Cais da Fundição em 1935 (foto: Hemeroteca Digital)
Partida do paquete "Moçambique" do Cais da Fundição em 1935 (foto: Hemeroteca Digital)
Nos anos 30, o Governo alemão, liderado por Hitler, usou os cruzeiros como forma de recompensa e de incentivo aos membros do partido nazi. Esta iniciativa constituiu um marco na história da indústria de cruzeiros, tornando as viagens disponíveis e muito acessíveis para a classe média. Muitos dos navios da “Kraft durch Freude” (Força pela Alegria) faziam escala em Lisboa, por vezes vinham dois ou três juntos e tinham direito a fogo de artifício no bonançoso Tejo. “Quando os turistas alemães desembarcavam, havia no portaló uma saca com moedas de dez escudos, dinheiro que o Estado dava a cada passageiro para poder gastar em terra”, conta o historiador.
Em breve, Lisboa tornar-se-ia o único porto livre e neutral da Europa, transformou-se em sala de espera de todos aqueles que procuravam fugir dos campos beligerantes do Velho Continente. Terminada a II Guerra Mundial, Salazar apostou no turismo como motor do desenvolvimento económico e o movimento marítimo de passageiros no porto de Lisboa, entretanto dotado com duas amplas e modernas estações marítimas, começou a registar um apreciável aumento de ano para ano.
Mas uma ameaça pairava no céu. O vertiginoso progresso dos tempos modernos criou, entre outras maravilhas, o avião, voando de um continente para outro e encurtando a duração das viagens. Seria o transatlântico expulso do mar?
Portugal não sentia a pressão do grande pássaro de metal. Ainda era mais barato atravessar o Atlântico de navio do que de avião e o tráfego marítimo intensificava-se. Paquetes como o “Pátria”, o “Império” e o “Uíge” faziam a carreira de África e o “Vera Cruz” e o “Santa Maria” faziam a carreira da América do Sul. Os dois últimos ofereciam cruzeiros de fim de ano à Madeira, para assistir ao inesquecível fogo de artifício. A origem deste festival de cores remonta a 1866 mas foi o hotel Reid’s que em 1924 organizou um espetáculo concentrado no anfiteatro da capital madeirense. A apoteose pirotécnica que assinalou a chegada do novo ano ultrapassou todas as expectativas perpetuando a tradição.

Movimento de passageiros no porto de Lisboa

Em 2018 o porto de Lisboa registou o melhor ano de sempre com 577.605 turistas. O principal mercado é inglês com uma quota de 42%, a segunda posição pertence ao mercado alemão, com 21%. Este ano, movimentou 55.985 passageiros até ao final de março. Até ao final do ano deverá chegar aos 450 mil.

Em 1916, durante I Guerra Mundial (1914-1918), o Governo português requisitou todos os navios alemães e austríacos refugiados em portos nacionais. Os navios apresados em Portugal passaram a constituir a frota dos Transportes Marítimos do Estado

Durante a II Guerra Mundial (1939-1945), foram destruídos 398 navios de passageiros em todo o mundo

Com o início da guerra colonial, os paquetes portugueses foram mobilizados para efetuar o transporte logístico de pessoa e material militar para territórios portugueses ultramarinos. A guerra arrastou ao longo de 13 anos, 800 mil portugueses para África

O imponente paquete inglês “Queen Mary” faz a primeira visita no rio Tejo em 1963, ficando fundeado ao lago Terreiro do Paço

O moderno transatlântico “France” entra no Tejo pela primeira vez em fevereiro de 1964, com cerca de 1200 passageiros

O “United States” fez a primeira escala na capital portuguesa a 24 de fevereiro de 1968, atracando na muralha da Rocha Conde de Óbidos. a bordo trazia cerca de 900 passageiros

Um ano mais tarde, o paquete “Queen Elizabeth 2”, da Cunard, navega no Tejo pela primeira vez
Apogeu dos anos 60
Em 1961, Portugal recebeu três modernos navios, o “Infante Dom Henrique”, o “Príncipe Perfeito” e o “Funchal”. Na véspera do 5 de outubro de 1961, com lotação esgotada, o “Infante Dom Henrique”, navio-almirante da Companhia Colonial de Navegação, deu início à primeira viagem pelo império português no continente africano. Na gare marítima da Rocha do Conde de Óbidos, centenas de pessoas assomavam à varanda para se despedirem do maior e mais belo navio de passageiros português.
A bordo do “Infante Dom Henrique”, estava Carlos do Carmo que nessa altura trabalhava para a Companhia Colonial de Navegação e foi o animador da viagem inaugural. Além de cantar à noite nos salões, selecionava as músicas que passavam na rádio que existia no navio e ainda fazia o jornal de bordo.
O moderno e requintado paquete estava cheio de obras de arte, uma estátua de bronze revestida a ouro, do escultor Álvaro de Brée, perpetuava a figura do infante, tendo como fundo um fresco representando o planisfério de Mecia de Viladestes, no vestíbulo da 1ª Classe. Além de dois restaurantes e bares, o “Infante Dom Henrique” dispunha de biblioteca, sala de leitura, cabeleireiro, duas capelas (cujos altares foram fabricados com pedra do promontório de Sagres) e quatro amplos salões. O navio, com capacidade para 1018 passageiros, realizou vários cruzeiros e transportou o Presidente da República Américo Thomaz em viagens oficiais.
De toda a frota de paquetes portugueses, o irrequieto e veloz “Funchal” foi o único concebido de raiz para servir o turismo da Madeira, que se pensava que iria ter um crescimento bastante acentuado. O navio chegou a Lisboa pela primeira vez a 19 de outubro de 1961. Dois anos passaram até receber um passageiro que iria ficar fascinado e acompanhar a sua história até aos dias de hoje.
Com seis anos, Luís Miguel Correia entra a bordo acompanhado do pai para uma viagem à Madeira. “O ‘Funchal’ cheirava a novo, era um navio muito clarinho, moderno e com uma tripulação muito jovem”, recorda. Nos primeiros anos fazia duas viagens seguidas à Madeira, Tenerife e Lisboa. “Era muito rápido, andava que se fartava”, acrescenta. Para o Funchal levava automóveis e pequenas cargas e no regresso trazia bananas. Depois fazia uma viagem intercalada à Madeira e aos Açores.
Além dos passageiros normais, levava também grupos de 60 ou 80 turistas distribuídos por três classes: primeira, turística A e turística B, onde os camarotes não tinham duche e a alimentação não era tão variada. António Passeira que trabalhou durante 50 anos na agência Abreu, foi um dos guias que acompanharam vários desses grupos. “A animação era feita com a prata da casa. Um pasteleiro que tinha uma boa voz, um mecânico que sabia tocar guitarra ou um oficial que tocava piano, juntavam-se à noite no salão para animar os passageiros.” Os cruzeiros com um ambiente familiar e onde se falava a língua de Camões, rapidamente conquistaram o coração dos portugueses. No apogeu dos anos 60, a chegada ou partida dos navios portugueses das carreiras das ilhas, África e Brasil não dava descanso aos guindastes do cais onde acostavam. Eram tempos em que as pessoas tinham orgulho na frota portuguesa.

Viagem inaugural do "Funchal" com destino ao Funchal (Coleção de Luís Miguel Correia)
Viagem inaugural do "Funchal" com destino ao Funchal (Coleção de Luís Miguel Correia)
Apogeu dos anos 60
Em 1961, Portugal recebeu três modernos navios, o “Infante Dom Henrique”, o “Príncipe Perfeito” e o “Funchal”. Na véspera do 5 de outubro de 1961, com lotação esgotada, o “Infante Dom Henrique”, navio-almirante da Companhia Colonial de Navegação, deu início à primeira viagem pelo império português no continente africano. Na gare marítima da Rocha do Conde de Óbidos, centenas de pessoas assomavam à varanda para se despedirem do maior e mais belo navio de passageiros português.
A bordo do “Infante Dom Henrique”, estava Carlos do Carmo que nessa altura trabalhava para a Companhia Colonial de Navegação e foi o animador da viagem inaugural. Além de cantar à noite nos salões, selecionava as músicas que passavam na rádio que existia no navio e ainda fazia o jornal de bordo.
O moderno e requintado paquete estava cheio de obras de arte, uma estátua de bronze revestida a ouro, do escultor Álvaro de Brée, perpetuava a figura do infante, tendo como fundo um fresco representando o planisfério de Mecia de Viladestes, no vestíbulo da 1ª Classe. Além de dois restaurantes e bares, o “Infante Dom Henrique” dispunha de biblioteca, sala de leitura, cabeleireiro, duas capelas (cujos altares foram fabricados com pedra do promontório de Sagres) e quatro amplos salões. O navio, com capacidade para 1018 passageiros, realizou vários cruzeiros e transportou o Presidente da República Américo Thomaz em viagens oficiais.
De toda a frota de paquetes portugueses, o irrequieto e veloz “Funchal” foi o único concebido de raiz para servir o turismo da Madeira, que se pensava que iria ter um crescimento bastante acentuado. O navio chegou a Lisboa pela primeira vez a 19 de outubro de 1961. Dois anos passaram até receber um passageiro que iria ficar fascinado e acompanhar a sua história até aos dias de hoje.
Com seis anos, Luís Miguel Correia entra a bordo acompanhado do pai para uma viagem à Madeira. “O ‘Funchal’ cheirava a novo, era um navio muito clarinho, moderno e com uma tripulação muito jovem”, recorda. Nos primeiros anos fazia duas viagens seguidas à Madeira, Tenerife e Lisboa. “Era muito rápido, andava que se fartava”, acrescenta. Para o Funchal levava automóveis e pequenas cargas e no regresso trazia bananas. Depois fazia uma viagem intercalada à Madeira e aos Açores.

Viagem inaugural do "Funchal" com destino ao Funchal (Coleção de Luís Miguel Correia)
Viagem inaugural do "Funchal" com destino ao Funchal (Coleção de Luís Miguel Correia)
Além dos passageiros normais, levava também grupos de 60 ou 80 turistas distribuídos por três classes: primeira, turística A e turística B, onde os camarotes não tinham duche e a alimentação não era tão variada. António Passeira que trabalhou durante 50 anos na agência Abreu, foi um dos guias que acompanharam vários desses grupos. “A animação era feita com a prata da casa. Um pasteleiro que tinha uma boa voz, um mecânico que sabia tocar guitarra ou um oficial que tocava piano, juntavam-se à noite no salão para animar os passageiros.” Os cruzeiros com um ambiente familiar e onde se falava a língua de Camões, rapidamente conquistaram o coração dos portugueses. No apogeu dos anos 60, a chegada ou partida dos navios portugueses das carreiras das ilhas, África e Brasil não dava descanso aos guindastes do cais onde acostavam. Eram tempos em que as pessoas tinham orgulho na frota portuguesa.
O declínio do transporte marítimo
Em 1972, a TAP introduziu os novos Boeing 747 para unir a metrópole com as colónias africanas, reduzindo drasticamente o tempo de viagem. Quando parecia que tudo corria mal, a Organização dos Países Exportadores de Petróleo decide aumentar repentinamente o preço do ouro negro. Entre 1973 e 1974, os preços do crude quadruplicaram para cerca de 12 dólares o barril, obrigando muitos navios a serem vendidos para a sucata. O golpe de misericórdia seria dado a 25 de abril de 1974. A mudança do rumo político do país permitiu que se pusesse fim a uma guerra que durava há 13 anos e desse início ao processo de descolonização, levando ao regresso de 500 mil pessoas à metrópole. Nos anos seguintes multiplicaram-se as imobilizações e desmantelamentos de paquetes moribundos. Apenas sobreviveram o “Infante Dom Henrique” e o “Funchal”.
Em fevereiro de 74, mesmo antes da revolução, a Empresa Insulana de Navegação fundiu-se com a Companhia Colonial de Navegação, dando origem à Companhia Portuguesa de Transportes Marítimos, nova proprietária do “Funchal”. A agência Abreu afretou o navio onde os padrões de conforto e qualidade de serviço tinham sido entretanto incomparavelmente melhorados. O paquete fez vários cruzeiros no Mediterrâneo, fiordes da Noruega, Suécia, Brasil, Açores e Madeira até 1985, ano em que o armador grego George Potamianos, apaixonado por Portugal, o adquiriu. Um ano depois comprou o “Infante Dom Henrique”, que após uma profunda remodelação foi rebatizado “Vasco da Gama” e navegou até 2004.
O “Funchal” realizou cruzeiros até setembro de 2010, altura em que parou para reconstrução imposta por novas normas de segurança no mar e a companhia não sobreviveu muito tempo depois do falecimento de Potamianos em 2012. O “Funchal”, “Princess Danae”, “Arion” e “Athena” foram vendidos ao empresário Rui Alegre em 2013, que fundou a Portuscale Cruises, empresa que acabou por perder o rumo, afundando-se em dívidas. O “Funchal”, o último sobrevivente da frota nacional, terminou em Lisboa o seu último cruzeiro a 2 de janeiro de 2015. Durante os anos seguintes ficou amarrado ao cais da Matinha, numa tristeza indefinida.
Em 2021, um grupo de investidores norte-americanos, compraram o paquete para o transformar em navio-hotel. O projeto para modernizar e readaptar o navio, ficou a cargo de Butch Kemper, que partilhou com o Expresso, o projeto, para o Cais da Matinha no valor de 100 milhões de euros. A ideia passava por construir uma marina para iates de 100 metros, clube de vela e dois heliportos.
O “Funchal” ficaria atracado na marina, como navio-hotel de cinco estrelas com restaurantes para todas as bolsas. Um restaurante com três estrelas Michelin, um rodízio e ainda outro onde se pudesse comer até 20 euros. E não só: um “piano bar” a evocar aquele que o “Funchal” teve nos seus tempos áureos, um casino, um parque infantil ou uma discoteca para atrair um público mais velho do que as discotecas habituais de Lisboa, com musica dos anos 80. Os barcos salva-vidas seriam transformados num espaço onde as pessoas poderiam ter um jantar privado ou simplesmente beber um copo ao fim do dia.
O “Funchal” esteve vários meses no Navalrocha, e tudo estava a correr de vento em popa, quando o projeto megalómano foi interrompido. Os investidores norte-americanos fecharam a torneira e Kemper foi afastado. O futuro do navio é agora bastante mais modesto, centro de eventos e mais tarde hotel. Novamente no cais da Matinha, o mítico “Funchal” agora pintado de branco, parece um barco de modelismo inacabado.

Paquete “Funchal” em agosto de 2013, depois de ser remodelado pelo empresário Rui alegre
Paquete “Funchal” em agosto de 2013, depois de ser remodelado pelo empresário Rui alegre
O declínio do transporte marítimo
Em 1972, a TAP introduziu os novos Boeing 747 para unir a metrópole com as colónias africanas, reduzindo drasticamente o tempo de viagem. Quando parecia que tudo corria mal, a Organização dos Países Exportadores de Petróleo decide aumentar repentinamente o preço do ouro negro. Entre 1973 e 1974, os preços do crude quadruplicaram para cerca de 12 dólares o barril, obrigando muitos navios a serem vendidos para a sucata. O golpe de misericórdia seria dado a 25 de abril de 1974. A mudança do rumo político do país permitiu que se pusesse fim a uma guerra que durava há 13 anos e desse início ao processo de descolonização, levando ao regresso de 500 mil pessoas à metrópole. Nos anos seguintes multiplicaram-se as imobilizações e desmantelamentos de paquetes moribundos. Apenas sobreviveram o “Infante Dom Henrique” e o “Funchal”.
Em fevereiro de 74, mesmo antes da revolução, a Empresa Insulana de Navegação fundiu-se com a Companhia Colonial de Navegação, dando origem à Companhia Portuguesa de Transportes Marítimos, nova proprietária do “Funchal”. A agência Abreu afretou o navio onde os padrões de conforto e qualidade de serviço tinham sido entretanto incomparavelmente melhorados. O paquete fez vários cruzeiros no Mediterrâneo, fiordes da Noruega, Suécia, Brasil, Açores e Madeira até 1985, ano em que o armador grego George Potamianos, apaixonado por Portugal, o adquiriu. Um ano depois comprou o “Infante Dom Henrique”, que após uma profunda remodelação foi rebatizado “Vasco da Gama” e navegou até 2004.
O “Funchal” realizou cruzeiros até setembro de 2010, altura em que parou para reconstrução imposta por novas normas de segurança no mar e a companhia não sobreviveu muito tempo depois do falecimento de Potamianos em 2012. O “Funchal”, “Princess Danae”, “Arion” e “Athena” foram vendidos ao empresário Rui Alegre em 2013, que fundou a Portuscale Cruises, empresa que acabou por perder o rumo, afundando-se em dívidas. O “Funchal”, o último sobrevivente da frota nacional, terminou em Lisboa o seu último cruzeiro a 2 de janeiro de 2015. Durante os anos seguintes ficou amarrado ao cais da Matinha, numa tristeza indefinida.

Paquete “Funchal” em agosto de 2013, depois de ser remodelado pelo empresário Rui alegre
Paquete “Funchal” em agosto de 2013, depois de ser remodelado pelo empresário Rui alegre
Em 2021, um grupo de investidores norte-americanos, compraram o paquete para o transformar em navio-hotel. O projeto para modernizar e readaptar o navio, ficou a cargo de Butch Kemper, que partilhou com o Expresso, o projeto, para o Cais da Matinha no valor de 100 milhões de euros. A ideia passava por construir uma marina para iates de 100 metros, clube de vela e dois heliportos.
O “Funchal” ficaria atracado na marina, como navio-hotel de cinco estrelas com restaurantes para todas as bolsas. Um restaurante com três estrelas Michelin, um rodízio e ainda outro onde se pudesse comer até 20 euros. E não só: um “piano bar” a evocar aquele que o “Funchal” teve nos seus tempos áureos, um casino, um parque infantil ou uma discoteca para atrair um público mais velho do que as discotecas habituais de Lisboa, com musica dos anos 80. Os barcos salva-vidas seriam transformados num espaço onde as pessoas poderiam ter um jantar privado ou simplesmente beber um copo ao fim do dia.
O “Funchal” esteve vários meses no Navalrocha, e tudo estava a correr de vento em popa, quando o projeto megalómano foi interrompido. Os investidores norte-americanos fecharam a torneira e Kemper foi afastado. O futuro do navio é agora bastante mais modesto, centro de eventos e mais tarde hotel. Novamente no cais da Matinha, o mítico “Funchal” agora pintado de branco, parece um barco de modelismo inacabado.
A nova indústria de cruzeiros
Nas últimas décadas, as companhias de navegação já tinham começado a reformular a indústria de cruzeiros. Construíram navios cada vez mais corpulentos com capacidade para 6 mil passageiros. Autênticas cidades flutuantes com promenades que não terminam. Portas que vão dar a um espaço exterior, depois ao interior e depois novamente ao exterior. Ruas que se prolongam por vários metros até irem dar a outras, que por sua vez vão dar a outras ainda. Criaram novos itinerários, diversificaram as atividades a bordo e introduziram “pacotes” para todos os gostos... e bolsos.
Em 2019, antes de o mundo entrar em guerra contra a covid-19 e ter silenciado os oceanos, a indústria de cruzeiros transportou cerca de 30 milhões de passageiros. Era uma indústria que movimentava €130 mil milhões e que empregava mais de 1 milhão de pessoas. Nesse ano, 70 mil portugueses optaram por fazer as suas férias a bordo de navios de cruzeiro e desses, 50% escolheram a MSC, líder no mercado europeu. O preço é apenas o segundo fator que mais interfere na escolha dos portugueses, sendo ultrapassado pelos itinerários como os fiordes, báltico, Mediterrâneo ou Caraíbas. Por outro lado, é atribuída uma importante relevância à credibilidade da empresa, oferta a bordo e mordomias. “Hoje a indústria de cruzeiros concorre com os resorts que apesar de paradisíacos, não deixam de ser estáticos. A bordo de um navio podemos visitar vários locais”, afirma Eduardo Cabrita, diretor-geral da MSC Cruzeiros em Portugal.
As atividades disponíveis a bordo multiplicam-se para cativar famílias e jovens, como piscinas, escorregas, escalada, espaços dedicados às crianças, restaurantes temáticos onde o detalhe de execução de cada prato pecaminoso é preparado por chefes com estrelas Michelin.
Todo este mundo de sonhos foi suspenso em 2020. Eduardo Cabrita explicou que 2021 foi um ano de transição, mesmo assim “muito simpático” em termos de vendas e acredita que “2022 será um ano de euforia”. A quarta maior frota do mundo tem atualmente 19 navios de cruzeiro e não pára de crescer. No final deste ano vai ser inaugurado o colossal “MSC World Europa”, será um dos maiores do mundo com capacidade para 6762 passageiros e 2138 tripulantes.
A frota de Mário Ferreira, presidente da Mystic Invest Holding, também não cessa de aumentar. Mas a principal aposta do armador é no sentido oposto: navios de expedição para 200 passageiros. Na noite de seis de abril de 2019, os estaleiros de Viana do Castelo receberam 400 ilustres convidados, entre os quais a cantora e antiga modelo Carla Bruni, convidada para ser madrinha do “World Explorer”. O primeiro-ministro, António Costa, e o mundo empresarial viu Mário Ferreira apresentar as viagens e fazer aparecer e desaparecer do palco hologramas de ursos no Ártico e baleias no Atlântico. A ocasião não era para menos, desde 1961 que Portugal não recebia um paquete a estrear, o “World Explorer” foi o primeiro em 58 anos e o primeiro a ser construído em Portugal.
A aposta num navio mais pequeno, com 126 metros de comprimentos e 19 de boca (largura), permite visitar locais remotos e atracar no centro das cidades onde os grandes paquetes de 6 mil passageiros não podem ou não devem entrar. Uma grande vantagem quer do ponto de vista da segurança dos passageiros quer ambiental.
A pandemia mudou muita coisa no ramo das viagens de cruzeiro e, como em quase todos os sectores, teve efeitos devastadores. A companhia de cruzeiros Cruise and Maritime Voyages foi uma das vítimas e declarou insolvência em 2020. Para Mário Ferreira, foi uma questão de oportunidade e adquiriu num leilão no Reino Unido o navio de passageiros “Vasco da Gama” por €8,5 milhões. Conta o empresário que quando o viu em Lisboa pela primeira vez “foi um momento emocionante e a realização do sonho”.
Após uma curta estada na capital portuguesa, o “Vasco da Gama”, com 219 metros de comprimento, rumou aos estaleiros da Lisnave, em Setúbal, onde foi alvo de uma intensa remodelação durante seis meses.

Primeira escala do "MSC Bellissima" em março de 2019
Primeira escala do "MSC Bellissima" em março de 2019
A nova indústria de cruzeiros
Nas últimas décadas, as companhias de navegação já tinham começado a reformular a indústria de cruzeiros. Construíram navios cada vez mais corpulentos com capacidade para 6 mil passageiros. Autênticas cidades flutuantes com promenades que não terminam. Portas que vão dar a um espaço exterior, depois ao interior e depois novamente ao exterior. Ruas que se prolongam por vários metros até irem dar a outras, que por sua vez vão dar a outras ainda. Criaram novos itinerários, diversificaram as atividades a bordo e introduziram “pacotes” para todos os gostos... e bolsos.
Em 2019, antes de o mundo entrar em guerra contra a covid-19 e ter silenciado os oceanos, a indústria de cruzeiros transportou cerca de 30 milhões de passageiros. Era uma indústria que movimentava €130 mil milhões e que empregava mais de 1 milhão de pessoas. Nesse ano, 70 mil portugueses optaram por fazer as suas férias a bordo de navios de cruzeiro e desses, 50% escolheram a MSC, líder no mercado europeu. O preço é apenas o segundo fator que mais interfere na escolha dos portugueses, sendo ultrapassado pelos itinerários como os fiordes, báltico, Mediterrâneo ou Caraíbas. Por outro lado, é atribuída uma importante relevância à credibilidade da empresa, oferta a bordo e mordomias. “Hoje a indústria de cruzeiros concorre com os resorts que apesar de paradisíacos, não deixam de ser estáticos. A bordo de um navio podemos visitar vários locais”, afirma Eduardo Cabrita, diretor-geral da MSC Cruzeiros em Portugal.
As atividades disponíveis a bordo multiplicam-se para cativar famílias e jovens, como piscinas, escorregas, escalada, espaços dedicados às crianças, restaurantes temáticos onde o detalhe de execução de cada prato pecaminoso é preparado por chefes com estrelas Michelin.
Todo este mundo de sonhos foi suspenso em 2020. Eduardo Cabrita explicou que 2021 foi um ano de transição, mesmo assim “muito simpático” em termos de vendas e acredita que “2022 será um ano de euforia”. A quarta maior frota do mundo tem atualmente 19 navios de cruzeiro e não pára de crescer. No final deste ano vai ser inaugurado o colossal “MSC World Europa”, será um dos maiores do mundo com capacidade para 6762 passageiros e 2138 tripulantes.

Primeira escala do "MSC Bellissima" em março de 2019
Primeira escala do "MSC Bellissima" em março de 2019
A frota de Mário Ferreira, presidente da Mystic Invest Holding, também não cessa de aumentar. Mas a principal aposta do armador é no sentido oposto: navios de expedição para 200 passageiros. Na noite de seis de abril de 2019 os estaleiros de Viana do Castelo receberam 400 ilustres convidados, entre os quais a cantora e antiga modelo Carla Bruni, convidada para ser madrinha do “World Explorer”. O primeiro-ministro, António Costa, e o mundo empresarial viu Mário Ferreira apresentar as viagens e fazer aparecer e desaparecer do palco hologramas de ursos no Ártico e baleias no Atlântico. A ocasião não era para menos, desde 1961 que Portugal não recebia um paquete a estrear, o “World Explorer” foi o primeiro em 58 anos e o primeiro a ser construído em Portugal.
A aposta num navio mais pequeno, com 126 metros de comprimentos e 19 de boca (largura), permite visitar locais remotos e atracar no centro das cidades onde os grandes paquetes de 6 mil passageiros não podem ou não devem entrar. Uma grande vantagem quer do ponto de vista da segurança dos passageiros quer ambiental.
A pandemia mudou muita coisa no ramo das viagens de cruzeiro e, como em quase todos os sectores, teve efeitos devastadores. A companhia de cruzeiros Cruise and Maritime Voyages foi uma das vítimas e declarou insolvência em 2020. Para Mário Ferreira, foi uma questão de oportunidade e adquiriu num leilão no Reino Unido o navio de passageiros “Vasco da Gama” por €8,5 milhões. Conta o empresário que quando o viu em Lisboa pela primeira vez “foi um momento emocionante e a realização do sonho”.
Após uma curta estada na capital portuguesa, o “Vasco da Gama”, com 219 metros de comprimento, rumou aos estaleiros da Lisnave, em Setúbal, onde foi alvo de uma intensa remodelação durante seis meses.
2022 será um ano de euforia
O setor dos cruzeiros deverá ultrapassar até ao final de 2023 o volume de passageiros registado em 2019. Num inquérito, efetuado pela CLIA (Associação Internacional de Companhias de Cruzeiros), foi constatado que a apetência pelas viagens de cruzeiro voltou a crescer, com 63% dos passageiros ou potenciais passageiros a considerarem ser “provável” ou “muito provável” fazer uma viagem de cruzeiro nos próximos dois anos. O mesmo estudo apontou que a chamada geração Y (pessoas que nasceram entre os anos 80 e início dos 90) é a mais propensa a repetir um cruzeiro.
Se vive em Lisboa e costuma passar junto ao rio Tejo já deve ter notado haver um movimento constante de navios de cruzeiro. O porto de Lisboa tem este ano previsto 358 escalas, de paquetes de todos os tamanhos e feitios, desde os mais clássicos com o casco preto aos mais arrojados, “tatuados” com sereias e corais.
Apesar de grandes incertezas sobre a guerra na Ucrânia, “ Lisboa deverá bater um novo recorde de movimentos em 2022”, afirma Ana Lourenço, responsável da área de cruzeiros do porto de Lisboa. “Já houve dias em que, por falta de espaço, foram recusadas algumas escalas”, acrescentou a responsável durante a cerimónia de batismo do “Silver Dawn”, no Terminal de Cruzeiros de Lisboa a 31 de março. Dos vários navios de cruzeiros que este ano fizeram a primeira escala na capital portuguesa, este foi um dos que se destacou pela sua singularidade.
A cerimónia começou com um dueto de apitos coordenados entre os navios ultraluxuosos “Silver Dawn” e “Silver Spirit” entoando a música da série “O Barco do Amor”. Depois foi a vez da madrinha do navio, Nilou Motamed, uma escritora de viagens e influenciadora digital, receber das mãos do comandante Samuele Failla um pequeno machado com o qual cortou o cabo que fez soltar a tradicional garrafa de champanhe contra o casco do navio. O evento terminou com um jantar de gala, seguido de dois minutos de fogo de artifício lançado a partir do terraço do Terminal de Cruzeiros de Lisboa.
No dia seguinte o navio afastou-se lentamente do cais; depois como é tradição, ouviram-se-se três apitos longos e um curto, foi o sinal da despedida. Como é costume com navios que visitam o porto de Lisboa pela primeira vez, juntou-se um rebocador embandeirado da Portugs, que o escoltou até à ponte sobre o Tejo, já sob o olhar atento do Cristo-Rei, ouviram-se novamente três apitos longos e um curto. O mestre do rebocador retribuiu os apitos com amabilidade enquanto o “Silver Dawn” embicava para as portas do Tejo.

O navio "Silver Spirit" visto do seu irmão "Silver Dawn" a 31 de março de 2022
O navio "Silver Spirit" visto do seu irmão "Silver Dawn" a 31 de março de 2022
2022 será um ano de euforia
O setor dos cruzeiros deverá ultrapassar até ao final de 2023 o volume de passageiros registado em 2019. Num inquérito, efetuado pela CLIA (Associação Internacional de Companhias de Cruzeiros), foi constatado que a apetência pelas viagens de cruzeiro voltou a crescer, com 63% dos passageiros ou potenciais passageiros a considerarem ser “provável” ou “muito provável” fazer uma viagem de cruzeiro nos próximos dois anos. O mesmo estudo apontou que a chamada geração Y (pessoas que nasceram entre os anos 80 e início dos 90) é a mais propensa a repetir um cruzeiro.
Se vive em Lisboa e costuma passar junto ao rio Tejo já deve ter notado haver um movimento constante de navios de cruzeiro. O porto de Lisboa tem este ano previsto 358 escalas, de paquetes de todos os tamanhos e feitios, desde os mais clássicos com o casco preto aos mais arrojados, “tatuados” com sereias e corais.
Apesar de grandes incertezas sobre a guerra na Ucrânia, “ Lisboa deverá bater um novo recorde de movimentos em 2022”, afirma Ana Lourenço, responsável da área de cruzeiros do porto de Lisboa. “Já houve dias em que, por falta de espaço, foram recusadas algumas escalas”, acrescentou a responsável durante a cerimónia de batismo do “Silver Dawn”, no Terminal de Cruzeiros de Lisboa a 31 de março. Dos vários navios de cruzeiros que este ano fizeram a primeira escala na capital portuguesa, este foi um dos que se destacou pela sua singularidade.

O navio "Silver Spirit" visto do seu irmão "Silver Dawn" a 31 de março de 2022
O navio "Silver Spirit" visto do seu irmão "Silver Dawn" a 31 de março de 2022
A cerimónia começou com um dueto de apitos coordenados entre os navios ultraluxuosos “Silver Dawn” e “Silver Spirit” entoando a música da série “O Barco do Amor”. Depois foi a vez da madrinha do navio, Nilou Motamed, uma escritora de viagens e influenciadora digital, receber das mãos do comandante Samuele Failla um pequeno machado com o qual cortou o cabo que fez soltar a tradicional garrafa de champanhe contra o casco do navio. O evento terminou com um jantar de gala, seguido de dois minutos de fogo de artifício lançado a partir do terraço do Terminal de Cruzeiros de Lisboa.
No dia seguinte o navio afastou-se lentamente do cais; depois como é tradição, ouviram-se-se três apitos longos e um curto, foi o sinal da despedida. Como é costume com navios que visitam o porto de Lisboa pela primeira vez, juntou-se um rebocador embandeirado da Portugs, que o escoltou até à ponte sobre o Tejo, já sob o olhar atento do Cristo-Rei, ouviram-se novamente três apitos longos e um curto. O mestre do rebocador retribuiu os apitos com amabilidade enquanto o “Silver Dawn” embicava para as portas do Tejo.

Previsão de escalas em 2022

O porto de Lisboa tem previsto para 2022 um recorde de 358 escalas de navios de cruzeiro. Treze são paquetes portugueses
Escalas de navios de cruzeiro nos últimos cem anos

O porto de Lisboa registou o recorde na atividade de cruzeiros em 2013, com 353 escalas. O principal operador foi a P&O Cruises, com 41 escalas. Até ao final de março de 2022 foram registadas 49 escalas de navios de cruzeiro

Evolução da frota de paquetes portugueses até aos dias de hoje


ÁFRICA
Anos em serviço: 1916-1932
Armador: Empresa Nacional de Navegação
Comprimento: 127,5 metros
Passageiros: 326

QUELIMANE (ex-Kronprinz)
Anos em serviço: 1916-1927
Armador: Transportes Marítimos do Estado
Comprimento: 125,3 metros
Passageiros: 304

ÍNDIA (ex-Vorwaertz)
Anos em serviço: 1916-1929
Armador: Transportes Marítimos do Estado
Comprimento: 131 metros
Passageiros: n.d.

ZAIRE (ex-Mormugão)
Anos em serviço: 1916-1929
Armador: Empresa Nacional de Navegação
Comprimento: 103,6 metros
Passageiros: 250

LOANDA (ex-São Vicente)
Anos em serviço: 1916-1938
Armador: Companhia Colonial de Navegação
Comprimento: 122,6 metros
Passageiros: 220

MOÇAMBIQUE (ex-Bruxellesville)
Anos em serviço: 1916-1938
Armador: Empresa Nacional de Navegação
Comprimento: 121,9 metros
Passageiros: 702

LOURENÇO MARQUES (ex-Admiral)
Anos em serviço: 1916-1950
Armador: Transportes Marítimos do Estado
e Companhia Nacional de Navegação
Comprimento: 121,9 metros
Passageiros: 823

NYASSA (ex-Trás-os-Montes)
Anos em serviço: 1916-1951
Armador: Transportes Marítimos do Estado
e Companhia Nacional de Navegação
Comprimento: 140,8 metros
Passageiros: 800

LIMA (ex-Westerwald)
Anos em serviço: 1916-1969
Armador: Empresa Insulana de Navegação
Comprimento: 111,6 metros
Passageiros: 314


PEDRO GOMES (ex-Sindoro)
Anos em serviço: 1922-1932
Armador: Companhia Nacional de Navegação
Comprimento: 123,4 metros
Passageiros: 440

NOVA LISBOA (ex-Angola)
Anos em serviço: 1923-1950
Armador: Companhia Nacional de Navegação
Comprimento: 133,8 metros
Passageiros: 454

JOÃO BELO (ex-Windhuk)
Anos em serviço: 1928-1950
Armador: Companhia Colonial de Navegação
Comprimento: 130,2 metros
Passageiros: 340

MOUZINHO (ex-Corcovado)
Anos em serviço: 1929-1954
Armador: Companhia Colonial de Navegação
Comprimento: 142,2 metros
Passageiros: 691


COLONIAL (ex-Ypiranga)
Anos em serviço: 1930-1950
Armador: Companhia Colonial de Navegação
Comprimento: 142,4 metros
Passageiros: 638

QUANZA
Anos em serviço: 1930-1968
Armador: Companhia Nacional de Navegação
Comprimento: 133,5 metros
Passageiros: 429


SERPA PINTO (ex-Princesa Olga)
Anos em serviço: 1940-1955
Armador: Companhia Colonial de Navegação
Comprimento: 142,4 metros
Passageiros: 704

PÁTRIA
Anos em serviço: 1947-1973
Armador: Companhia Colonial de Navegação
Comprimento: 161,9 metros
Passageiros: 798

IMPÉRIO
Anos em serviço: 1948-1974
Armador: Companhia Colonial de Navegação
Comprimento: 161,9 metros
Passageiros: 799

ANGOLA
Anos em serviço: 1948-1974
Armador: Companhia Nacional de Navegação
Comprimento: 167,1 metros
Passageiros: 741

MOÇAMBIQUE
Anos em serviço: 1949-1972
Armador: Companhia Nacional de Navegação
Comprimento: 167 metros
Passageiros: 749


ÍNDIA
Anos em serviço: 1951-1971
Armador: Companhia Nacional de Navegação
Comprimento: 131,8 metros
Passageiros: 387

TIMOR
Anos em serviço: 1951-1974
Armador: Companhia Nacional de Navegação
Comprimento: 131,4 metros
Passageiros: 387

VERA CRUZ
Anos em serviço: 1952-1973
Armador: Companhia Colonial de Navegação
Comprimento: 185,8 metros
Passageiros: 1242

SANTA MARIA
Anos em serviço: 1953-1973
Armador: Companhia Colonial de Navegação
Comprimento: 185,6 metros
Passageiros: 1182

UÍGE
Anos em serviço: 1954-1978
Armador: Companhia Colonial de Navegação
e Companhia Portuguesa de Transportes Marítimos desde 1974
Comprimento: 145,5 metros
Passageiros: 571

NIASSA
Anos em serviço: 1955-1979
Armador: Companhia Nacional de Navegação
e Companhia Portuguesa de Transportes Marítimos desde 1974
Comprimento: 151,3 metros
Passageiros: 322


PRÍNCIPE PERFEITO
Anos em serviço: 1961-1976
Armador: Companhia Nacional de Navegação
Comprimento: 190,4 metros
Passageiros: 1000

INFANTE DOM HENRIQUE
Anos em serviço: 1961-1995
Armador: Companhia Colonial de Navegação
e Companhia Portuguesa de Transportes Marítimos.
Em 1986 o armador George Potamianos, comprou o navio,
que ressuscitou como Vasco da Gama em 1988
Comprimento: 195,5 metros
Passageiros: 1018

FUNCHAL
Anos em serviço: 1961-2019
Armador: Empresa Insulana de Navegação
e Companhia Portuguesa de Transportes Marítimos desde 1974.
Em 1985 foi comprado pelo armador George Potamianos (CIC)
e em 2013 foi adquirido pela Portuscale Cruises
Comprimento: 152,4 metros
Passageiros: 402

AMÉLIA DE MELLO (ex-Zion)
Anos em serviço: 1966-1972
Armador: Sociedade Geral
Comprimento: 152,8 metros
Passageiros: 323
ANGRA DO HEROÍSMO (ex-Israel)

Anos em serviço: 1966-1974
Armador: Empresa Insulana de Navegação e Companhia Nacional de Navegação a partir de 1968
Comprimento: 152,8 metros
Passageiros: 323


LISBOA (ex-Princess Danae)
Anos em serviço: 1996-2015
Armador: Classic International Cruises
e Portuscale Cruises a partir de 2013
Comprimento: 162,3 metros
Passageiros: 670

PORTO (ex-Arion)
Anos em serviço: 1999-2018
Armador: Classic International Cruises
e Portuscale Cruises a partir de 2013
Comprimento: 116,8 metros
Passageiros: 367


ASTORIA (ex-Athena, ex-Azores)
Anos em serviço: 2005-2020
Armador: Classic International Cruises
e Portuscale Cruises a partir de 2013
Comprimento: 167 metros
Passageiros: 566

WORLD EXPLORER
Ano de construção: 2019
Armador: Mário Ferreira / Mystic Cruises
Comprimento: 125,8 metros
Passageiros: 200


WORLD VOYAGER
Ano de construção: 2020
Armador: Mário Ferreira / Mystic Cruises
Comprimento: 125,8 metros
Passageiros: 200

VASCO DA GAMA
Ano de construção: 2020
Armador: Mário Ferreira / Mystic Ocean
Comprimento: 125,8 metros
Passageiros: 1000

WORLD NAVIGATOR
Ano de construção: 2021
Armador: Mário Ferreira / Atlas Ocean Voyages
Comprimento: 125,8 metros
Passageiros: 200

WORLD TRAVELLER
Ano de construção: 2022 (setembro)
Armador: Mário Ferreira / Atlas Ocean Voyages
Comprimento: 125,8 metros
Passageiros: 200

WORLD SEEKER
Ano de construção: 2023
Armador: Mário Ferreira / Atlas Ocean Voyages
Comprimento: 125,8 metros
Passageiros: 200
O renascer da frota portuguesa
Com 20 anos, Mário Ferreira — hoje acionista da Media Capital através da holding Pluris Investments — embarcou no enorme e luxuoso paquete “Vistafjord”, onde trabalhou durante cinco anos. Em 1993 cria a empresa Ferreira & Rayford iniciando assim a sua atividade marítimo-turística no Douro. Compra o cacilheiro “Castelo” à Transtejo e em homenagem ao navio da Cunard onde tinha trabalhado, batiza-o “Vistadouro”.
Face ao êxito e à crescente procura, cria a Douro Azul e compra uma nova embarcação. Foi o início de um percurso que deu origem à Mystic Invest Holding. Em 2015 compra a Nicko Cruises, uma empresa alemã quatro vezes maior do que a Douro Azul.
Agora, aos 54 anos, o homem que entretanto se tornou armador, tem uma frota de 56 navios de passageiros: 22 no Douro, 29 navios-hotel a operar pelos principais rios, como o Danúbio, Reno, Elba, Nilo, Yangtzé e Mekong, na China, e cinco navios oceânicos. O mais recente navio da classe “World” fará a sua estreia na capital portuguesa em setembro. Nos estaleiros da West Sea, em Viana do Castelo, estão ainda a ser construídos três navios de expedição.
Créditos
Texto, infografia e fotografia Jaime Figueiredo
Arquivo Portos de Lisboa, Setúbal e Sesimbra
Fontes Boletim Mensal da Administração Geral do Porto de Lisboa
e “Paquetes Portugueses”, de Luís Miguel Correia
Webdesign Tiago Pereira Santos
Apoio web João Melancia
Coordenação Joana Beleza
Direção João Vieira Pereira
Expresso 2022
