As audições de políticos, militares e responsáveis da PJ na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) permitiram vislumbrar uma parte do enredo político em redor do assalto a Tancos.

Paralelamente, a investigação policial vai somando arguidos no caso. São já 21 os suspeitos, entre os que encenaram a descoberta do arsenal e os que assaltaram os paióis na madrugada de 27 de junho de 2017. Lá para o final do verão haverá acusação, mas sobre um eventual julgamento nem vale a pena arriscar datas.

Dois anos depois, o Expresso traça o filme possível do roubo do século.

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2019

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As datas a amarelo dizem respeito a tudo o que se passou na CPI
e as datas a verde revelam passo a passo a investigação da PJ

19 de junho

Os deputados da CPI apresentaram o relatório final com os votos contra do PSD e do CDS. O documento iliba António Costa de qualquer tipo de responsabilidade política no processo. O primeiro-ministro "só teve conhecimento, em 12 de outubro de 2018, através do seu chefe de gabinete, dos documentos que haviam sido entregues ao chefe de gabinete do ministro da Defesa". É ainda recomendada a participação das Forças Armadas nas reuniões da unidade que combate o terrorismo e a criação de "mecanismo eficaz de comunicação e de gestão de alertas" que permita evitar situações semelhantes às que ocorreram nos paióis nacionais de Tancos.

12 de junho

Em resposta ao relatório preliminar do PS sobre o inquérito de Tancos, o CDS não deixa pedra sobre pedra. Para os centristas, o PS ilibou o ex-ministro da Defesa, Azeredo Lopes, e António Costa. O primeiro-ministro fez afirmações que “não correspondem à verdade” quando disse, a 26 de outubro de 2018, que não tinha tido conhecimento do memorando que descrevia a operação de encenação para recuperar as armas, apesar de o seu chefe de gabinete ter confirmado na comissão que lhe entregou o documento a 12 de outubro, dia da demissão de Azeredo Lopes. Quanto ao ex-ministro, soube da operação “paralela” e “ilegal” da Polícia Judiciária Militar e não deu conhecimento disso ao Ministério Público.

31 de maio

No relatório preliminar elaborado pelo deputado do PS Ricardo Bexiga, o Governo sai isento de culpas. O relator garante que a PJM tentou implicar Azeredo e Marcelo na questão da encenação para recuperar as armas e que nenhum deles se apercebeu da operação ilegal de resgate da armas na Chamusca. "Não era objetivamente percetível qualquer encenação ilícita ou criminosa, nem se tratava de obter um encobrimento do procedimento por parte do ministro da Defesa".

22 de maio

Costa só leu o memorando no dia da demissão de Azeredo Lopes, a 12 de outubro de 2018. "Foi-me presente pelo meu chefe de gabinete um documento não assinado, não datado e não timbrado", afirma. Esse documento tinha-lhe sido entregue pelo assessor militar, major-general Tiago Vasconcelos, "a quem pouco tempo antes nesse mesmo dia fora facultado pelo tenente-general Martins Pereira [chefe de gabinete de Azeredo]", assegurou. "Nesse documento refere-se a existência de um informador", acrescentou. “Fiquei com a convicção de que o ex-ministro da Defesa Nacional nunca o tinha visto anteriormente." Um ano antes, o coronel Luís Vieira e o major Vasco Brazão, da PJM, tinham entregado esse documento ao chefe de gabinete de Azeredo, no Ministério da Defesa.

7 de maio

O ex-comandante dos Comandos, coronel Pipa Amorim, envia uma carta aos deputados da CPI, refutando tudo o que o ex-chefe do Estado-Maior do Exército (CEME), general Rovisco Duarte, disse sobre si em audição. De “inenarrável prestação” a “défice de estabilidade e inteligência emocional”, Rovisco é acusado de ter mentido no Parlamento por "ódio e vingança". Em causa, o processo de investigação na morte de dois Comandos do curso 127. Uma carta que mostra que o verniz estalou há muito no seio do Exército.

7 de maio

Apesar de garantir que desconhecia a operação paralela da Polícia Judiciária Militar (PJM) para achar o arsenal de guerra, Azeredo Lopes admite aos deputados que esta polícia agiu à margem das orientações estabelecidas pela então Procuradora-Geral da República, Joana Marques Vidal, que tinha passado o caso à PJ e DCIAP, colocando a Judiciária Militar de parte. “A PJM não seguiu as regras”, frisou Azeredo Lopes no Parlamento.

Revela também que ficou a saber das operações clandestinas pela então Procuradora-Geral da República, Joana Marques Vidal, que lhe telefonou a 18 de outubro de 2017 (logo após o achamento das armas na Chamusca) “incomodada” com o facto de a PJM estar a agir ilegalmente ao investigar o caso à revelia da PJ civil. A ex-PGR, revelou, queria avançar com processos disciplinares contra os militares e até avisou o diretor da PJM, o coronel Luís Vieira, desse facto. Mas acabou por desistir, tendo o DCIAP ido mais longe, com um inquérito-crime.

O ex-ministro garante não ter "nenhuma memória" de ter lido o memorando entregue no dia 20 de outubro de 2017 ao seu ex-chefe de gabinete e que apenas foi informado sobre o "essencial" da informação que chegou a Martins Pereira. "Não tenho memória de alguma vez ter visto fisicamente esse documento. Li-o em momento posterior ou em momento simultâneo à minha demissão. Fiquei confortado, porque considero que o meu chefe de gabinete, no contexto em que recebe a informação, me transmite o essencial”.

Assegura também que Costa não teve conhecimento do memorando da PJM.

2 de maio

João Gomes Cravinho revela aos deputados que durante a passagem de testemunho no ministério da Defesa, a 15 de outubro de 2018, não falou com Azeredo sobre o processo de Tancos.

O atual ministro prevê um "investimento de 42 milhões de euros" na segurança dos paióis militares, de modo a que não se repita um assalto semelhante.

Admite que Tancos possa vir a ser novamente utilizado, mas até lá o material de guerra que aí se encontrava vai continuar a estar guardado em Santa Margarida, Marco do Grilo (Marinha) e Alcochete (Força Aérea).

Afirma também que a inspeção à PJM, revelou "uma quebra no dever de cooperação por parte de elementos da PJM" e que o relatório, confidencial, foi remetido à PGR e aos ramos militares para "que procedam em conformidade".

29 de abril

Os procuradores do DCIAP têm ouvido de novo alguns dos 21 arguidos do caso. Foi precisamente esse um dos motivos pelo qual o juiz de instrução, João Bártolo, declarou em março a especial complexidade do processo, já que as novas audições poderiam dar uma nova perspetiva à investigação. Pelo menos três suspeitos do roubo foram ao DCIAP, bem como alguns arguidos ligados à investigação paralela da PJM.

O tenente-coronel Luís Sequeira, chefe de secção da investigação criminal de Faro da GNR, que na altura do roubo liderava o núcleo de investigação criminal da GNR de Loulé, foi constituído arguido pouco tempo depois de depor na CPI. Foi o 21º arguido da “Operação Húbris”.

11 de abril

Na CPI, o general Martins Pereira confirma ter recebido no Ministério da Defesa o coronel Luís Vieira e o major Vasco Brazão na manhã de 20 de outubro de 2017. Os dois militares da PJM entregaram-lhe dois documentos: uma "fita do tempo" e um papel "não timbrado e não assinado" e que lhe pareceu feito "com alguma pressa".

Sobre se passou o memorando para Azeredo, respondeu: “Se enviei ao não, não me lembro, o ministro diz que nunca viu o documento, eu confio no ministro.”

Tal como havia afirmado no DCIAP em 2018, o chefe de gabinete de Azeredo assegurou que “não descortinou" no documento qualquer sinal de "encenação" ou encobrimento: para o militar, é natural que uma polícia tivesse uma"interação com informadores" e que esses informadores impusessem condições" para prestarem as informações.

10 de abril

Numa das audições que mais polémica causou, o coronel Luís Vieira, ex-diretor da PJM e arguido no processo, admitiu ter transmitido aos seus homens que recuperar as armas era a prioridade principal neste processo, que não era da competência da PJM, mas da PJ.

“Não foi uma encenação mas uma recuperação.” O ex-diretor - que esteve em prisão preventiva entre setembro de 2018 e fevereiro de 2019 - insinuou até que os seus subordinados poderão ter feito um “pacto de silêncio” para o deixar de fora do processo.

Luís Vieira revelou ter pedido a Marcelo e a Azeredo, durante uma visita aos paióis assaltados, a 4 de julho de 2017, que intercedessem por si junto da procuradora-geral da República e da ministra da Justiça para que o processo voltasse às mãos da PJM. O Presidente da República desmentiu o coronel, negando tal conversa e disse que, olhando para trás, estava “feliz por nunca ter falado” com o então líder da PJM.

4 de abril

Um dos depoimentos mais esperados foi o de Vasco Brazão, investigador-chefe da PJM, que confirmou ter ido com o coronel Luís Vieira ao Ministério da Defesa para entregar o memorando ao então chefe de gabinete do ex-ministro da Defesa Azeredo Lopes, general Martins Pereira. Considerou o documento uma "versão resumida" dos factos e contou que o ex-diretor da PJM, falou ao telefone através do 'Whatsapp', comunicando ao então ministro da Defesa, na presença do chefe de gabinete, que a recuperação do material "não ocorreu da forma que tinha sido publicitada, mas sim através de um informador". Afirmou aos deputados que Azeredo ficou a conhecer a operação de encenação da entrega do material na Chamusca.

2 de abril

Guerra no interior da PJM. Os depoimentos no mesmo dia do major Pinto da Costa e do sargento Mário Lage de Carvalho, da PJM, ambos arguidos, e do coronel Manuel Estalagem, que já não se encontra nos quadros da PJM, abriu mais feridas no interior da instituição.

Os operacionais da PJM revelaram versões opostas, contradições e acusações entre militares que investigaram o caso do desaparecimento do arsenal de guerra. Os dois primeiros apontaram o dedo às chefias pela operação clandestina.

Por sua vez, Estalagem, o ex-diretor do departamento de investigação criminal da PJM, foi perentório: “Foi com algum alívio que recebi a PJ no processo. A PJM não tinha competência para andar aí nos bairros problemáticos à procura das armas. As outras polícias é que estão formatadas para isso.” Uma opinião diferente daquela que tinha Luís Vieira e Vasco Brazão, ambos arguidos no caso por suspeitas de organizar a operação ilegal nas costas da PJ.

28 de março

O tenente-coronel Luís Sequeira, chefe de secção da investigação criminal de Faro da GNR que na altura do roubo liderava o núcleo de investigação criminal da GNR de Loulé, garantiu aos deputados que não tinha dados que lhe permitissem concluir que o aparecimento do arsenal, na Chamusca, em outubro de 2017, fosse uma encenação.

Também assegurou que na altura em que trabalhava no caso em conjunto com a PJM se lembra de lhe ter "chegado alguma informação em concreto de que o processo estaria a ser investigado especificamente pela Polícia Judiciária".

E não estranhou que o caso estivesse nas mãos a Polícia Judiciária Militar.

Dois meses depois da audição foi constituído arguido na “Operação Húbris”por suspeitas da prática de crimes de associação criminosa, denegação de justiça e prevaricação e falsificação de documento. O militar, o 21º arguido do caso, foi suspenso de funções, proibido de contactar com arguidos e militares e ainda de se ausentar para o estrangeiro.

26 de março

O diretor da PJ, Luís Neves, não teve dúvidas de que houve “uma encenação” feita pela Judiciária Militar para recuperar o arsenal de guerra num baldio da Chamusca em outubro de 2017, quatro meses após o assalto. Essa operação foi “desmontada” pelos homens do contra-terrorismo da PJ. Antes disso acontecer, a PJM minou a investigação da Judiciária civil através de fugas de informação para os jornais. “Os suspeitos ficaram a saber que eram suspeitos e acabou com o efeito surpresa da investigação”, acusou.

21 de março

O ex-diretor da polícia Judiciária, Almeida Rodrigues, confirma que a PJ recebeu uma carta com uma denúncia de que iria ocorrer um furto numa instalação militar. Garantiu no entanto que não chegou a tomar conhecimento dessa carta.

"A PJ teve conhecimento, eu, como diretor nacional, não", afirmou.

Almeida Rodrigues diz que soube do assalto através de um telefonema do coronel Luís Vieira, na altura diretor da Polícia Judiciária Militar, considerando o furto "extraordinariamente grave".

Mas adianta que ao longo da sua carreira, investigou crimes de roubo ou furto “um bocadinho melhor planeados". Sobre a guerra entre PJM e PJ, afiançou que ficou a saber dos “desentendimentos" através da comunicação social.

12 e 13 de março

Júlio Pereira, ex-secretário-geral dos Serviços de Informações, critica os militares por não terem avisado de imediato as forças policiais e as "secretas" nos momentos seguintes ao roubo. Se isso tivesse acontecido, alertou “talvez houvesse ainda a possibilidade de detetar alguma coisa relacionada com o furto”.

E volta a frisar que ficou a saber do furto através dos jornais. Júlio Pereira fala ainda numa suposta lista de compras de armamento que circulava entre organizações criminosas e que as armas da lista coincidiam com as de Tancos. No dia seguinte, a atual secretária-geral do SIRP, Graça Mira Gomes, não desmente Júlio Pereira, falando na suposta lista de compras, mas que esta não estava relacionada com as armas de Tancos. “São processos diferentes.”

7 de março

Os procuradores Vítor Magalhães e Cláudia Porto ganham mais seis meses para concluir a investigação e a acusação do caso. O Ministério Público argumenta que precisa de mais tempo para concluir as perícias aos telefones móveis, computadores e tablets dos suspeitos.

Os investigadores dizem ainda que precisam voltar a interrogar os vinte arguidos e 15 testemunhas.

Cláudia Porto e Vítor Magalhães lembram “o caráter altamente organizado” dos crimes em investigação, “a dispersão territorial dos factos” e a “complexidade da análise” dos equipamentos eletrónicos para pedir que o processo seja considerado de especial complexidade.

O juiz de instrução João Bártolo aceita o pedido do MP e declara especial complexidade do processo.

6 de março

Numa longa audição, o general Rovisco Duarte, ex-chefe do Estado Maior do Exército, tece fortes críticas aos generais que se demitiram no pós-Tancos - “estive muito sozinho” - e arrasa aqueles que eram responsáveis pela segurança dos paióis - “havia assadores porque [Tancos] era um campo de férias com piquenique”.

Mas nega que existissem pressões políticas para demitir (ou readmitir) responsáveis.

Garante ainda que não saiu do Exército por causa do roubo. "A minha demissão nada teve a ver com o caso de Tancos". Saiu por discordar das políticas sobre a Lei de Programação Militar do novo ministro e por solidariedade com Azeredo.

Rovisco bateu com a porta a 17 de outubro de 2018, cinco dias após Azeredo ter apresentado a demissão a António Costa.

27 de fevereiro

O ex-chefe do Estado Maior-General das Forças Armadas, Pina Monteiro, admite discordar da decisão "singular, solitária e controversa" do antigo chefe do Exército, o general Rovisco Duarte, de exonerar cinco comandantes de unidades após o furto de Tancos. "Não fazia nada daquilo". Também não concorda com a demissão de dois tenentes-generais, Faria Menezes e José Calçada, por discordarem da decisão de Rovisco Duarte.

26 de fevereiro

O general Antunes Calçada, ex-comandante do Pessoal, defende perante os deputados que o general Rovisco Duarte e os seus generais deveriam demitir-se caso se provasse uma responsabilidade do comando no furto de Tancos.

José Antunes Calçada, que se demitiu em protesto pela exoneração de cinco comandantes de unidades do Exército dias após o furto, explica que pediu para passar à reserva por que o ex-CEME Rovisco Duarte não o exonerou, a seu pedido. Admite que a responsabilidade do assalto era do Exército: "A responsabilidade é toda nossa".

13 de fevereiro

O ex-chefe do Estado-Maior do Exército (CEME), Carlos Jerónimo, acredita que o furto de material de guerra dos paióis de Tancos tenha ocorrido com "conivência" do interior. "Não sei como foi o roubo. Para mim, tal como na arrecadação dos comandos, tem de haver conivência lá de dentro. Não estou a afirmar", diz o general na reserva, que comandou o Exército entre 2014 e 2016. "Como é que desapareceram as 'Glock' da polícia? Com conivência lá de dentro. Quando o pilha-galinhas está dentro da capoeira... 'pfff'", diz o general aos deputados.

13 de fevereiro

O Tribunal da Relação de Lisboa manda libertar o coronel Luís Vieira, ex-diretor da PJM. O militar estava em prisão preventiva desde setembro de 2017, após as primeiras detenções da Unidade Nacional de Contra-Terrorismo da PJ na Operação Húbris.

A desembargadora Adelina Oliveira considera que Luís Vieira deu informações objetivas, diretas e honestas aos investigadores e procuradores do caso de Tancos.

O facto de ser um militar com mais de 40 anos de serviço no Exército, condecorado e com uma folha de serviço considerada sem mácula, estar na reserva e ter sido afastado de funções, também pesou para a mudança da medida de coação mais gravosa (a prisão preventiva) para uma outra menos pesada (termo de identidade e residência com a obrigação de apresentações semanais às autoridades).

6 de fevereiro

Um dos depoimentos que causa maior incredulidade foi o de João Luís de Sousa Pires, comandante da Unidade de Apoio Geral de Material do Exército de 2015 a 2016, no ano anterior ao furto do material de guerra. Apesar de a videovigilância de Tancos estar obsoleta, os militares mantinham a rotina de tirar e colocar a cassete de um gravador que não funcionava. O sistema de videovigilância começou a funcionar com falhas em 2006, foi considerado inoperacional em 2012 e em 2013 dado como obsoleto.

23 de janeiro

O coronel João Paulo Almeida confessa que houve “um lapso de [cerca de] vinte horas” entre rondas ao perímetro do complexo militar de Tancos de 27 para 28 de junho de 2017. Aos deputados concede que era demasiado tempo. Acrescenta que a indicação dada aos militares não era de um número de rondas específico por dia, mas apenas que fizessem o “máximo possível”. Este militar responsável pela segurança de Tancos entre 12 de junho e 12 de julho de 2017, confirma que as instalações estavam visivelmente degradadas; as redes estavam “corroídas” e as fechaduras em mau estado; o pára-raios não funcionava; havia quem pensasse que o tempo de serviço ali prestado servia para “dormir”.

11 de janeiro

'Baião' era amigo e ex-sócio de João Paulino, o principal suspeito do roubo do arsenal de Tancos. 'Baião' é o 20º arguido do caso, tendo ficado em prisão preventiva. Vivia e trabalhava nos últimos tempos na cidade de Bienne, na Suíça. E que há quatro meses, João Paulino viajou do Porto para ir ter com ele rumo à Suíça. O encontro foi rápido, tendo apenas durado um dia. De acordo com a investigação, João Paulino tinha uma relação de grande confiança com este arguido que fazia parte do chamado grupo de Ansião, localidade onde ficava situado o bar gerido por João Paulino. Há, aliás, outros arguidos detidos que são desta cidade.

10 de janeiro

O coronel Ferreira Duarte revela que Rovisco Duarte lhe disse que a decisão de o exonerar, em julho de 2017, fazia parte de uma "estratégia de comunicação" para mostrar a transparência do Exército.

O militar era, à altura do furto, o comandante do Regimento de Infantaria n.º 15, de Tomar, uma das unidades responsáveis por fornecer militares para a vigilância dos paióis nacionais de Tancos e foi, com outros quatro comandantes, exonerado pelo ex-CEME no dia 1 de julho e nomeado para as mesmas funções no dia 18 seguinte.

O coronel Ferreira Duarte, responsável por uma das unidades que faziam a vigilância dos paióis de Tancos, diz que soube do furto de material de guerra pelas notícias, no dia seguinte. “Quem tinha de saber, soube imediatamente", acrescentando que a unidade de Engenharia n.º 1 foi informada. "Nessa altura não era eu que estava responsável pelos depósitos. A responsabilidade do regimento 15 era de março e abril e depois setembro e outubro. Tomámos conhecimento oficialmente e de seguida recebemos diretivas específicas para melhorar e aumentar o pessoal", afirma.

9 de janeiro

O coronel Joaquim Vieira Esperança, ex-comandante do regimento de infantaria de Tomar, admite que o número de oito militares a vigiar os paióis de Tancos era "o mínimo que poderia ser exigido". O militar foi taxativo aos deputados: "Oito militares, perante o grau de ameaça, era o mínimo que poderia ser exigido", afirma o coronel que comandou entre 2013 e 2016 um dos regimentos responsáveis pelo patrulhamento dos paióis.

2018

28 de dezembro

O misterioso “Fechaduras” é o nortenho Paulo Lemos, quase uma lenda no submundo do crime. Todos o conhecem por essa alcunha, que ganhou por ser capaz de abrir todo o tipo de portas com as mínimas ferramentas. O seu nome surgiu associado a dois mediáticos processos: o assalto aos paióis de Tancos, de que é arguido mas em liberdade, e o roubo das 57 pistolas Glock do armeiro da PSP.

Ao contrário da esmagadora maioria dos arguidos de ambos os casos, “Fechaduras” optou por falar ao MP. E não falou pouco.

Está no entanto por apurar se o que revelou aos procuradores que lideram ambos os processos terá alguma correspondência com a realidade. Garantiu que foi Laranjinha - um dos nove detidos na segunda parte da Operação Húbris - que combinou entregar os explosivos furtados a um elemento da ETA, organização terrorista que já desapareceu do mapa.

Também assegurou que o furto nos paióis da madrugada de 28 de junho de 2017 era liderado por Laranjinha e João Paulino, ex-fuzileiro, que está em prisão preventiva desde o final de setembro.

20 de dezembro

Furriel Filipe Abreu terá dado aos cúmplices detalhes sobre as fragilidades e horários das rondas em Tancos e informação sobre o armamento que podiam roubar. “Aquilo é tranquilo, não tem segurança.” O militar, que tinha fugido para Espanha e depois se entregou à Justiça, conhecia bem as rotinas das instalações militares e terá revelado alguns destes segredos ao tio, também ele arguido no processo.

Foi interrogado pelo Ministério Público por duas vezes. Justificou ter entrado no assalto para ter dinheiro para pagar as despesas médicas da mãe acamada. Este ex-militar do Exército estava colocado no regimento de Engenharia n.º1, em Tancos, na altura do assalto aos paióis nacionais no final de junho do ano passado.Participou em 2018 num curso de formação da GNR na zona sul do país. E aguardava a luz verde da Guarda para integrar os quadros.

19 de dezembro

Juiz de instrução João Bártolo liberta três dos oito suspeitos do assalto a Tancos. Os restantes cinco ficam em prisão preventiva, indiciados pelos crimes de associação criminosa e tráfico de armas. O magistrado deixa cair o crime imputado pelo Ministério Público de terrorismo internacional. Só João Paulino, o ex-fuzileiro que é suspeito de ser o cérebro do assalto, é o único arguido formalmente suspeito deste último crime.

18 de dezembro

Onde está escondido o arsenal desaparecido? Faltará recuperar 1450 munições de 9 mm, 30 cargas de explosivos e diversas granadas, do total do material roubado em Tancos. Este armamento é suficiente para provocar o descarrilamento de um comboio ou fazer explodir a porta de uma carrinha blindada − e não se sabe em que mãos estão. Pode estar escondido em terrenos de Tomar, junto à propriedade da família de João Paulino. Ou já sido vendidos a traficantes de armas. As especulações são mais do que muitas.

18 de dezembro

Um ano, cinco meses e 17 dias depois, a PJ resolveu uma boa parte do mistério do assalto a Tancos. Os investigadores concluíram que o assalto foi planeado e montado por João Paulino, um ex-fuzileiro que seria informador da GNR de Loulé e da PJ militar, e que terá recrutado os operacionais no submundo do tráfico de droga, onde tem várias ligações. Sobretudo no centro e sul do país.

Paulino é de Albufeira, mas geria um bar em Ansião. E foi detido no final de setembro na primeira fase da operação Húbris, encontrando-se em prisão preventiva até hoje.

Falta recuperar 1450 munições de 9 mm, 30 cargas de explosivos e diversas granadas, do total do material roubado em Tancos. Este armamento é suficiente para provocar o descarrilamento de um comboio ou fazer explodir a porta de uma carrinha blindada − e não se sabe em que mãos estão. Pode estar escondido em terrenos de Tomar, junto à propriedade da família de João Paulino. Ou já sido vendidos a traficantes de armas. As especulações são mais do que muitas.

A Comissão Parlamentar de Inquérito, baseada no depoimento do diretor da PJ, Luís Neves, na AR, corrigiu o número de lança-granadas roubados. Em vez de 44, como havia divulgado inicialmente, foram afinal 124. Mais oitenta do que os primeiros números apontados pelas autoridades. Ou seja, material que também poderá estar desaparecido.

17 de dezembro

A Unidade Nacional de Contra-Terrorismo (UNCT) da PJ e o Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP) realizam várias buscas na zona centro e no Algarve no âmbito da Operação Húbris II, que acabou com a detenção de oito pessoas. Em causa estão os crimes de associação criminosa, furto, detenção e tráfico de armas, terrorismo internacional e tráfico de estupefacientes. Três meses depois das nove detenções da primeira fase da Operação Húbris que investiga a operação ilegal da PJM para a recuperação das armas.

O tráfico de armas não era a atividade principal a que se dedicava o grupo de assaltantes dos paióis do Exército em Tancos. A Polícia Judiciária e os dois procuradores do Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP), Vítor Magalhães e João Melo, que estão a investigar o caso assumem que este também é um enredo que envolve um esquema alargado de tráfico de droga. Daí que alguns dos arguidos estejam também indiciados por este tipo de crime. Na propriedade da família de João Paulino, em Tomar, foi aliás encontrada cocaína. Alguns dos cúmplices serão há muitos anos traficantes de droga.

5 de dezembro de 2018

A CPI ao furto de material militar dos paióis de Tancos decide ouvir, até maio de 2019, mais de 60 personalidades e entidades, incluindo o depoimento, por escrito, do primeiro-ministro, António Costa. Todos os requerimentos foram aprovados por unanimidade pelos partidos, à exceção da lista de personalidades apresentadas pelo PS, dado que os partidos da oposição, PSD e CDS-PP, queriam que ficasse em aberto a possibilidade de António Costa poder depor presencialmente. Até os suspeitos do assalto estavam na lista, mas acabam por não ser ouvidos no parlamento.

28 de novembro

O Ministério Público decide juntar os processos-crime que investigam o roubo e o aparecimento do armamento militar dos paióis de Tancos. Inicialmente tinham sido abertos dois inquéritos de investigação, um sobre o roubo e, posteriormente, outro sobre o aparecimento das armas na Chamusca.

14 de novembro

Van Dunem sabe “zero” sobre a operação ilegal da PJM. A ministra da Justiça garante no Parlamento que nada sabe sobre o caso do furto e do alegado encobrimento das armas de Tancos.

Questionada pelo deputado do PSD Carlos Peixoto sobre o que sabia sobre o processo de Tancos, lembrando que a ex-procuradora-geral da República falou com o antigo ministro da Defesa, Francisca Van Dunem disse "Sobre o desaparecimento das armas sei zero e do encobrimento zero. Só conheço as notícias dos jornais."

9 de novembro

Ainda o mistério do assalto a Tancos não tinha assumido as proporções que viria a ter, quando a 9 de setembro, Rui Rio aproveita uma passagem pela Universidade de Verão do PSD, em Castelo de Vide, para exigir que se apure toda a verdade. Mas também profere uma frase misteriosa: “E eu não disse tudo o que sei [sobre Tancos]”.

Mais tarde, a 25 de setembro, quando o diretor da PJM foi detido e se soube da encenação da recuperação do material, o líder do PSD voltou a reagir como se tivesse algum conhecimento do caso: “Estava efetivamente à espera, estava era à espera que já tivesse sido”, afirmou. Foi o único político a assumir que sabia mais alguma coisa sobre o assunto. Mas o líder do PSD estava apenas a deduzir, assumiu ao Expresso em novembro.

8 de novembro

O ministro da Administração Interna, Eduardo Cabrita, diz no Parlamento que nunca falou com a sua antecessora Constança Urbano de Sousa, nem com a GNR, sobre a recuperação das armas furtadas em Tancos. O governante pediu, logo após as detenções, à Inspeção-Geral da Administração Interna (IGAI) que abrisse um inquérito aos quatro militares da GNR constituídos arguidos, "para apuramento das responsabilidades disciplinares eventualmente existentes".

5 de novembro

António Costa refere-se à ansiedade do Presidente da República em relação à conclusão do processo de Tancos. Afirma que o Governo tinha de ser mais contido sobre essa matéria, mas que a ansiedade do executivo não era menor. Estas declarações foram interpretadas como sendo uma farpa ao chefe de Estado.

A polémica obrigou a novas declarações de Costa, que rejeita em absoluto essa interpretação, e garante que São Bento e Belém estão "em total convergência desde o primeiro dia" sobre o tema. Também Marcelo negou divergências com o Governo em relação a Tancos e afirmou que ambos, assim como todos os portugueses, querem que se apure toda a verdade, com conclusões o mais rapidamente possível.

Marcelo desmente contactos com a PJM sobre Tancos. O Presidente da República “nunca recebeu o diretor da PJM ou qualquer elemento dessa instituição”, esclareceu Belém, a propósito da reportagem do programa “Sexta às 9” da RTP. E “nenhum membro da Casa Civil ou da Casa Militar falou ou escreveu ao Presidente da República sobre a operação da descoberta das armas de Tancos, antes de ela ter ocorrido”.

Assim como “não existe na Casa Civil ou na Casa Militar da Presidência da República qualquer documento relativo a operação de recuperação das armas de Tancos, antes ou depois de ter ocorrido”.

3 de novembro

“Se pensam que me calam, não me calam”, disse o Presidente da República ao jornal “Público”. Quem está a tentar calar Marcelo? O Chefe de Estado não o disse. Marcelo Rebelo de Sousa mostra-se irritado com os que o tentam envolver na “nebulosa” em que se tornou o “caso Tancos”, sugerindo que o Presidente da República teve conhecimento da operação de encobrimento através do tenente-general João Ramirez Cordeiro, ex-chefe da Casa Militar da Presidência da República, depois de contactos mantidos com a PJM.

2 de novembro

O ministro da Administração Interna, Eduardo Cabrita, garante não ter tido "conhecimento nem qualquer informação relativa à recuperação das armas" furtadas em Tancos.

O ministro recorda que "não exercia as funções de Ministro da Administração Interna à data da recuperação do material furtado". Os deputados do PSD queriam perceber que informações tinha Cabrita sobre os militares da GNR detidos no caso.

30 de outubro

Parlamento recebe lista das armas e munições desaparecidas. A listagem do material de guerra furtado em Tancos recuperado pela PJM em outubro de 2017 enviada à Comissão Parlamentar de Defesa confirma que falta recuperar cinco granadas e mais de 30 cargas de explosivos, como o Expresso havia noticiado em julho. A lista do que falta recuperar refere "1.450 munições de 9mm, um disparador de descompressão, duas granadas de gás lacrimogéneo, uma granada ofensiva, duas granadas ofensivas de corte para instrução, 20 cargas lineares de corte CCD20 e 15 cargas lineares de corte CCD30".

28 de outubro

Na sua primeira intervenção pública como ministro da Defesa, João Gomes Cravinho afirma ser "fundamental ter a garantia que as lições foram aprendidas" com o "caso Tancos". Revelou a existência de duas auditorias internas à PJM, cujos resultados só serão conhecidos em abril de 2019.

27 de outubro

A ex-procuradora-geral da República, Joana Marques Vidal, recusou confirmar se falou ou não com o ex-ministro da Defesa Azeredo Lopes sobre a atuação da PJ Militar no caso de Tancos, argumentando que o fará perante a Justiça.

“Não vou confirmar ou infirmar o que uma testemunha prestou ou terá prestado, no âmbito de um inquérito que está em investigação e que está em segredo de justiça. Estou pronta para esclarecer no local próprio, quando me quiserem convocar as entidades com competência para tal.”

Na CPI de Tancos, Azeredo Lopes acabou por revelar a existência do telefonema de Joana Marques Vidal, em tom irritado, logo a seguir à descoberta das armas na Chamusca.

Na quarta manchete consecutiva sobre o caso, o Expresso revela que o ex-ministro da Defesa Azeredo Lopes foi informado do documento que descrevia parte da operação clandestina da PJM, mas não percebeu que havia um encobrimento de um dos culpados do roubo. E não achou estranha a existência de um informador da PJM, algo que considerava comum existir nos órgãos de investigação criminal.

O Presidente da República garante, uma vez mais, que não sabia sobre a recuperação encenada do material militar de Tancos por parte dos militares da PJM.

Quanto ao grau de conhecimento de António Costa, a fórmula foi ligeiramente diferente: “Não fiquei com a impressão de que soubesse”, disse Marcelo. Já se Azeredo Lopes informou ou não o primeiro-ministro, o Presidente da República não se comprometeu. “Tenho a noção de que até à publicação da nota do Ministério Público, eu não sabia. Ao nível de quantos falaram comigo sobre esta matéria, e falámos muitas vezes, eu não fiquei com a impressão que qualquer dessas pessoas soubesse o que se passava.”

O primeiro-ministro diz não conhecer o memorando sobre o furto de material militar dos paióis de Tancos, “nem através de Azeredo Lopes, nem através de ninguém”. Ao ser inquirido sobre se achava que tinha sido enganado por Azeredo Lopes responde: “Acho que não”. E conclui: “A única coisa que eu desejo é que as autoridades judiciárias competentes concluam, tão depressa quanto possível, esta investigação esclarecendo tudo, desde logo quem roubou, detendo e responsabilizando os ladrões e, naturalmente, eventuais cúmplices ou encobridores que tenha havido.”

25 de outubro

O ex-ministro da Defesa Nacional, Azeredo Lopes, manifesta ao Departamento Central de Investigação e Ação Penal [DCIAP] "total e completa disponibilidade e interesse" em ser ouvido sobre o caso de Tancos.

"Face às notícias de hoje sobre o chamado `caso de Tancos´, contactei o DCIAP, tendo manifestado, "com respeito pleno pela autonomia decisória da PGR [Procuradoria-Geral da República], a minha total e completa disponibilidade e interesse em ser ouvido pela investigação deste caso", disse José Azeredo Lopes, numa declaração enviada à Lusa. A PGR confirmou a disponibilidade do ex-ministro.

24 de outubro

O tenente-general Martins Pereira, ex-chefe de gabinete do ex-ministro da Defesa, garante, durante o interrogatório do Ministério Público, ter informado Azeredo Lopes do memorando sobre a operação encenada em Tancos que lhe foi entregue, há menos de um ano, pelo então diretor da Polícia Judiciária Militar (PJM), o coronel Luís Vieira. A informação foi avançada pelo “Público” e pelo “Correio da Manhã”.

Martins Pereira é inquirido na qualidade de testemunha, não tendo sido constituído arguido. De acordo com a sua versão dos factos, assim que recebeu o memorando sobre a operação encenada passou imediatamente a informação ao governante, a quem ligou pela rede WhatsApp, cujos telefonemas e mensagens são encriptados.

Durante o inquérito do MP, Martins Pereira colocou o seu telemóvel à disposição dos investigadores para perícia, de forma a que seja comprovado aquilo que alega.

20 de outubro

Toda a verdade, “doa a quem doer”. O Presidente da República garante desconhecer os factos na base do desaparecimento e reaparecimento das armas de Tancos, recordando que tem insistido na exigência do esclarecimento de "toda a verdade, doa a quem doer".

Em resposta a perguntas da Agência Lusa sobre se sabia dos factos relacionados com o reaparecimento das armas furtadas há mais de um ano do paiol de Tancos, o chefe de Estado sublinha que, desde junho de 2017, "nalguns casos semana a semana", tem insistido "no sentido de exigir o esclarecimento de toda a verdade, doa a quem doer".

20 de outubro

Expresso revela o memorando de Tancos. Documento não timbrado e não assinado que foi entregue pelo coronel Luís Vieira, então diretor da PJM, e pelo major Vasco Brazão, inspetor-chefe daquela polícia, no gabinete do assessor de Azerdo Lopes em 2017 mostra como informação do encobrimento chegou ao Governo. Oposição não deixa cair o caso e aponta baterias ao primeiro-ministro António Costa.

Duas cópias da "fita do tempo" elaborada em 2017 pela PJM foram entregues ao Ministério Público pelo major Vasco Brazão (em prisão domiciliária) e pelo ex-chefe de gabinete de Azeredo Lopes, na semana anterior, relatando a cronologia dos acontecimentos que tiveram lugar a 18 de outubro de 2017, quando foram resgatadas as armas roubadas de Tancos.

De acordo com este documento (um dos que Brazão assegura terem sido entregues no Ministério da Defesa no final do ano passado numa reunião em que também esteve presente o então diretor da PJM, Luís Vieira, e o tenente-general Martins Pereira), o na altura chefe do Estado-Maior do Exército (CEME), Rovisco Duarte, indicou que o melhor local para guardar o arsenal era o campo de Santa Margarida.

Também segundo a "fita do tempo", foi Rovisco Duarte quem deu ordens para os cinco elementos da Unidade Nacional de Contra-Terrorismo (UNCT) da PJ serem proibidos de entrar na unidade, a não ser que apresentassem um mandado judicial. Ao Expresso, Rovisco Duarte negou ter dado essa ordem

19 de outubro

O general João Cordeiro, ex-chefe da Casa Militar de Marcelo Rebelo de Sousa, diz que não teve conhecimento "formal ou informal" de qualquer operação em torno da recuperação das armas furtadas em Tancos. "Que eu me recorde, sobre esta questão do encobrimento, não tive qualquer conhecimento, nem formal, nem informal", diz à agência Lusa o general João Cordeiro, que, em novembro de 2017, deixou o cargo de Chefe da Casa Militar do Presidente da República, que é também Comandante Supremo das Forças Armadas.

17 de outubro

Rovisco Duarte bate com a porta. O Chefe de Estado-Maior do Exército (CEME), general Rovisco Duarte, entrega o pedido de demissão ao novo ministro da Defesa, João Gomes Cravinho. O Ministério da Defesa e a Presidência da República informam que o CEME sai por "por motivos pessoais".

Já o CEME justifica a decisão porque “as circunstâncias políticas assim o exigiram”. O general Antunes da Fonseca será nomeado para o lugar de Rovisco Duarte. Esta saída surge cinco dias depois da demissão de Azeredo Lopes do Ministério da Defesa.

13 de outubro

O ex-diretor da PJM, coronel Luís Vieira nega a existência do memorando da PJM, admitindo mesmo que o documento tenha sido fabricado com o intuito de prejudicar Azeredo Lopes. Uma versão que veio baralhar ainda mais um processo já de si complexo. O coronel confirma reunião no Ministério da Defesa, mas garante não ter conhecimento do documento que o major Vasco Brazão diz ter entregado ao chefe de gabinete de Azeredo Lopes. Luís Vieira esteve detido preventivamente no presídio de Tomar entre setembro de 2018 e fevereiro de 2019. Acabou por ser libertado após um acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa.

12 de outubro

O primeiro-ministro, António Costa (D), acompanhado pelo ministro da Defesa Nacional, Azeredo Lopes (E), durante a visita à Base Aérea n.º 5, em Monte Real, em Leiria, 08 de outubro de 2018

Azeredo Lopes apresenta a demissão ao primeiro-ministro. A posição do ministro da Defesa estava fragilizada devido ao caso da recuperação das armas furtadas em Tancos. Alega querer evitar que as Forças Armadas sejam “desgastadas pelo ataque político” e pelas “acusações de que disse estar a ser alvo por causa do processo de Tancos.

O ministro volta a negar que tenha tido conhecimento, "direto ou indireto, sobre uma operação em que o encobrimento se terá destinado a proteger o, ou um dos, autores do furto".

Quanto ao momento em que decidiu sair, Azeredo Lopes explica que quis aguardar pela finalização da proposta de Orçamento do Estado para 2019 para "não perturbar" esse processo com a sua saída.

Para o seu lugar irá João Gomes Gravinho.

11 de outubro

O general Martins Pereira, ex-chefe de gabinete do ministro da Defesa Azeredo Lopes, entrega ao Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP) documentação sobre a operação clandestina da PJM na Chamusca. O então chefe de gabinete tinha já assumido, depois de uma notícia do Expresso, a existência de uma reunião no Ministério da Defesa com o então diretor da PJM, o coronel Luís Vieira, e o major Vasco Brazão, investigador daquela polícia. “A documentação verdadeira foi entregue hoje no início da tarde, no DCIAP, pelos serviços do meu advogado”, adiantou o general à RTP.

Foi a primeira vez que assume ter recebido um memorando por parte dos dois militares da PJM naquela reunião que teve lugar em novembro. A 4 de outubro, numa declaração escrita à agência Lusa, Martins Pereira tinha-se limitado a confirmar o encontro sem no entanto fazer qualquer referência a documentos que lhe tenham sido entregues nessa altura.

8 de outubro

O major Vasco Brazão, arguido na Operação Húbris que se encontra em prisão domiciliária, avisa formalmente o Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP) que pretende entregar o memorando sobre a operação da entrega das armas de Tancos e prestar os esclarecimentos adicionais aos procuradores que investigam o caso.

O DCIAP foi alertado após as notícias do Expresso sobre as declarações de Vasco Brazão ao juiz de instrução João Bártolo e as reações do ministro da Defesa, Azeredo Lopes, que negou categoricamente ter sido informado sobre a operação da PJM.

Num depoimento de oito horas, o major disse a João Bártolo que no final de 2017 entregou no Ministério da Defesa, em conjunto com o então diretor da PJM, o coronel Luís Vieira, um memorando com informações sobre a operação da PJM.

4 de outubro

“Desconheço em absoluto o que tenha sido dito por qualquer pessoa em qualquer depoimento, que aliás presumo que esteja em segredo de justiça”, afirmou António Costa ao Expresso. “Conheço o que de modo inequívoco o ministro da Defesa Nacional já declarou em público e que não suscita qualquer quebra de confiança”. Estas foram as declarações do primeiro-ministro em reação à notícia do Expresso em que o major Vasco Brazão, da PJM, apontou o dedo ao então ministro da Defesa sobre o seu alegado conhecimento da operação de ilegal de recuperação das armas de Tancos. Pouco antes, Azeredo tinha declarado que se recusava a demitir por causa destas suspeitas.

3 de outubro

No final de 2017, e já depois das armas terem sido recuperadas, o major Vasco Brazão, investigador da Polícia Judiciária Militar (PJM), e o diretor daquela polícia, coronel Luís Vieira, deram conhecimento ao ministro da Defesa da encenação montada em conjunto com a GNR de Loulé em torno da recuperação das armas furtadas nos paióis de Tancos. Isso mesmo garante a 2 de outubro de 2018 o major Vasco Brazão, durante o interrogatório de oito horas no Campus da Justiça com o juiz de instrução João Bártolo. Vasco Brazão fica em prisão domiciliária após ser ouvido sobre o roubo de Tancos.

Confrontado pelo Expresso, o ministro da Defesa recusa-se a comentar a informação dada por Vasco Brazão ao tribunal, invocando o segredo de justiça. Contudo, questionado sobre se foi ou não informado da operação de encobrimento na recuperação das armas de Tancos, o ministro da Defesa responde categoricamente que "não". Nem antes dessa operação ter sido realizada, em outubro, nem depois dela, no final do ano de 2017.

29 de setembro

Os assaltantes terão levado o armamento de guerra furtado para uma propriedade da família de João Paulino, um ex-fuzileiro, situada perto de Tomar e apenas a 35 quilómetros de distância dos paióis do Exército. Trata-se de um restaurante abandonado e um pequeno armazém.

As armas e munições de Tancos terão ficado aí escondidas entre junho e outubro de 2017. Nesse verão, a PJM e a GNR de Loulé combinaram com João Paulino a entrega das armas, numa operação encoberta e sem o conhecimento da PJ e DCIAP.

Na madrugada de 18 de outubro, os assaltantes devolveram a maior parte do material de guerra, que ficou depositado num baldio na Chamusca. A PJM encenou a entrega, simulando um telefonema anónimo para o piquete desta força policial. O armamento foi transferido pela PJM para o quartel de Santa Margarida nessa mesma manhã.

Na primeira manchete após as detenções, o Expresso revelava alguns pormenores do caso. Munições, granadas e bombas estavam escondidas a 35 quilómetros dos paióis de Tancos, na propriedade da avó do principal suspeito. Foram transportadas dali para a Chamusca por dois elementos da GNR, numa carrinha da PJM, onde foram depositadas para serem encontradas... pelos próprios.

28 de setembro

Luís Vieira, diretor da Polícia Judiciária Militar, e João Paulino, o suspeito civil envolvido no caso das armas de Tancos ficam em prisão preventiva. O Tribunal de Instrução Criminal (TIC) de Lisboa revela que os restantes seis arguidos ficaram em liberdade, embora sujeitos a termo de identidade e residência, suspensão do exercício de funções, proibição de contacto com os coarguidos e com quaisquer militares das Forças Armadas, da GNR e elementos da Polícia Judiciária Militar.

Quanto ao major Vasco Brazão, ficaria em prisão domiciliária na semana seguinte, depois de regressar da missão na República Centro Africana e de ser também ouvido pelo juiz de instrução João Bártolo.

25 de setembro

Início da Operação Húbris. Oito militares da GNR de Loulé e PJM, entre eles o diretor desta polícia, o coronel Luís vieira, e também um civil, o ex-fuzileiro João Paulino, foram detidos pela PJ por indícios de associação criminosa, denegação de justiça, prevaricação, falsificação de documentos, tráfico de influência, favorecimento pessoal praticado por funcionário, abuso de poder, detenção de arma proibida e tráfico de armas. São suspeitos de terem orquestrado uma operação encenada e ilegal de recuperação das armas roubadas em Tancos.

13 de julho

Para poder manter sob escuta seis suspeitos do assalto a Tancos, os procuradores do MP encarregados da investigação revelaram num recurso que, ao contrário do que tinha sido veiculado pelo Exército e pelo Ministério da Defesa, ainda há granadas e explosivos que não foram devolvidos.

O material de guerra pode ser usado em atentados terroristas ou para arrombar portas blindadas, e o MP diz mesmo que a segurança nacional está em perigo enquanto os assaltantes não forem capturados.

Trata-se de de 1.450 munições de 9mm, um disparador de descompressão, duas granadas de gás lacrimogéneo, uma granada ofensiva, duas granadas ofensivas de corte para instrução, 20 cargas lineares de corte CCD20 e 15 cargas lineares de corte CCD30.

22 de março

Portas e fechaduras sem os requisitos de segurança exigidos e a rede de segurança periférica degradada foram algumas das "deficiências e lacunas" identificadas nos Paióis Nacionais de Tancos, indica o relatório do Ministério da Defesa intitulado Tancos 2017: Factos e Documentos. "Existem diversas deficiências/lacunas ao nível das estruturas, entre as quais se destacam as seguintes: as portas não têm os requisitos de segurança exigidos; as fechaduras não têm os requisitos de segurança exigidos".

O documento de cem páginas destaca ainda que nunca foi cumprido o número de efetivos originalmente determinado para a segurança da infraestrutura.

19 de janeiro

“Assunto encerrado”, diz o general Rovisco Duarte no início de 2018. O Chefe do Estado-Maior do Exército declara que o furto de material de guerra em Tancos "é um assunto encerrado", depois de terem sido concluídos quatro processos disciplinares. "Para o Exército é um assunto encerrado, os paióis estão desativados, fizemos a transferência das munições para Marco do Grilo, Santa Margarida e Alcochete e os processos que havia de âmbito disciplinar correram a sua tramitação dentro dos prazos legais", disse Rovisco Duarte.

O general frisa que "o Exército fez o que tinha a fazer" e que o "trabalho está feito". O Exército concluiu os quatro processos disciplinares abertos na sequência do furto de material de guerra em Tancos, determinando a pena mais gravosa a um sargento que não mandou fazer as rondas.

2017

27 de junho

Os ladrões sabiam o que faziam. Na base militar de Tancos, situada em Vila Nova da Braquinha, no distrito de Santarém, as torres de vigia estavam vazias, os intervalos entre as rondas dos militares, que nem sequer tinham munições nas armas, eram dilatados e as câmaras de videovigilância, bem como os sensores de movimentos, estavam obsoletos desde 2015.

Algures entre a noite de 27 de junho (uma terça-feira) e a manhã do dia seguinte, presume-se que três ou quatro homens saíram de uma carrinha, fizeram dois buracos na rede da zona norte e entraram à socapa no campo.

Munidos de um saca-cilindros, arrombaram as fechaduras de dois dos vinte paiolins e serviram-se, roubando granadas de mão ofensivas, 44 lança-granadas-foguetes descartáveis M72 LAW, 18 granadas de gás lacrimogéneo, e 1450 cartuchos de munição de nove milímetros.

Arrumado o material de guerra na carrinha, que pesa no total perto de 300 quilos, o grupo fugiu dali, conduzindo primeiro pela estrada de terra batida e depois pela estrada municipal que liga à A23.

Um grupo de três ou quatro homens fizeram dois buracos na rede de delimitação da base de Tancos, mais precisamente na zona norte junto a uma das torres de vigia. Esta rede tem 460 metros de comprimento e encontra-se bastante degradada, o que terá facilitado a entrada ilegal na base. Os ladrões teriam conhecimento de que o sistema de videovigilância estava avariado há dois anos, bem como o sensor de movimento, e que não havia soldados nas torres de vigia nem nas imediações.

O assalto aos dois paiolins ter-se-á realizado com rapidez: os suspeitos arrombaram a fechadura CRC (não muito diferentes das usadas em algumas casas particulares) de quatro trancas e o portão, levando o material bélico que pretendiam, deixando para trás o que não estava na lista de encomendas.

Os assaltantes teriam uma boa constituição física, o que lhes permitiria transportar a pé os cerca de 300 quilos de material bélico durante 420 metros, a distância que separa os paiolins do perímetro de segurança. Trata-se de uma estrada de alcatrão com espaço suficiente para a circulação de viaturas. Poderão ter feito o percurso mais do que uma vez. Da parte de fora da rede encontrava-se estacionada uma viatura, muito possivelmente uma carrinha de transporte de grandes volumes.

Depois de colocado no veículo o material bélico, que estaria no interior de caixotes, os assaltantes deslocaram-se de carrinha, primeiro na estrada de terra batida e depois pela estrada municipal que liga à A23 (uma viagem de 900 metros). A A23 faz a ligação, a oeste, à A1 (via Torres Novas) e, a este, a Castelo Branco, e posteriormente a Espanha. Uma viagem de carro entre Tancos até à fronteira demora duas horas.

28 de junho

Por volta das 16h40, um grupo de militares apercebeu-se de que as portas dos paiolins tinham sido arrombadas e deu o alarme às chefias. Poucas horas depois, a Polícia Judiciária Militar (PJM) foi alertada pelo Exército do furto. Mal chegou a Tancos ao início dessa noite, a PJM pediu ajuda à GNR para a despistagem de explosivos. Ao final desse dia, uma procuradora do Ministério Público também já tinha tido conhecimento do caso. Na quinta-feira, foi a vez de a Polícia Judiciária civil, e não só, ficar informada sobre o assunto.

29 de junho

O furto das armas de guerra foi referido ao mais alto nível às 10h, na reunião mensal de segurança realizada no Estado-Maior General das Forças Armadas (EMGFA). O encontro, dirigido pelo CISMIL (Centro de Informações e Segurança Militares), teve início uma hora e meia antes de ser divulgado o comunicado do Exército sobre o roubo. E na sala estavam elementos dos três ramos das forças armadas, da GNR e da PSP, e ainda representantes do SIS e do SIED, bem como do Centro de Segurança Militar e de Informações do Exército (CSMIE).

Um representante da PJM informou os restantes responsáveis do furto do arsenal, mas existem versões diferentes sobre a forma como foi feita a comunicação.

Há quem garanta que foi dado ênfase à gravidade do caso, mas também quem considere que o tema foi falado apenas de forma vaga e informal.

Daí a explicação para as palavras de Júlio Pereira, o então secretário-geral da Sistema de Informações da República Portuguesa (SIRP), que um mês depois, ouvido na comissão de Defesa Nacional, garantiu que soube do roubo pela comunicação social.

As redações dos jornais entraram em sobressalto com o comunicado emitido pelo Exército, por volta das 11h40 de 29 de junho, que dava conta do “desaparecimento de material de guerra, especificamente granadas de mão ofensivas e munições de calibre de nove milímetros”, dos Paióis Nacionais de Tancos.

30 de junho

Novo comunicado acrescenta que entre o material de guerra roubado estão granadas foguete anticarro, granadas de gás lacrimogéneo e explosivos. Três dias depois, o jornal online espanhol “El Confidencial” publica a lista total do arsenal roubado.

Após o roubo, e perante as gritantes fragilidades de segurança da base, o Exército apressou-se a enumerar medidas para evitar um novo roubo: primeiro foi prometido que o sistema de videovigilância voltaria a funcionar ainda em 2017, algo que não foi para a frente dada a mudança de planos para desativar os paióis de Tancos, o que veio a acontecer em novembro.

Foi também reforçado o número de rondas a pé e de carro, já com os militares devidamente armados. Até então, o carregador que seguia encaixado na G3 estava vazio e apenas havia munições no segundo carregador que traziam no cinto mas que se encontravam seladas.

1 de julho

Durante a agitada semana que se seguiu ao roubo, o general Rovisco Duarte, chefe do Estado-Maior do Exército (CEME), anuncia a exoneração de cinco comandantes de unidades do ramo para não interferirem com os processos de averiguações sobre o furto em Tancos. Tratava-se do comandante da Unidade de Apoio da Brigada de Reação Rápida, do Regimento de Infantaria 15, do Regimento de Paraquedistas, do Regimento de Engenharia 1 e da Unidade de Apoio de Material do Exército.

Os militares viriam a ser readmitidos quinze dias depois com o argumento de que, com a conclusão das averiguações, se encontravam ultrapassadas as razões que justificaram a sua exoneração. O ministro da Defesa, Azeredo Lopes, lembrou no entanto que nenhum dos cinco comandantes estaria livre de ser responsabilizado nas investigações em curso.

O nível de alerta manteve-se moderado em Portugal, apesar da dimensão do roubo, que foi noticiado em todo o mundo e alertou principalmente as polícias de Espanha e França. A manutenção do grau de ameaça terrorista foi divulgada na quarta-feira seguinte ao furto, numa reunião liderada por Augusto Santos Silva (António Costa estava de férias) nas instalações do Sistema de Segurança Interna, em Lisboa, para “avaliar eventuais efeitos sobre a segurança interna” do furto de material de guerra.

Por outras palavras, Costa não teria de regressar das férias numa ilha espanhola, que se tinham iniciado no dia em que Rovisco Duarte exonerou os cinco comandantes.

Uma semana depois do desaparecimento das armas, a Procuradoria-Geral da República (PGR) anuncia que existem suspeitas da prática dos crimes de associação criminosa, tráfico de armas internacional e terrorismo internacional no assalto a Tancos.

Por ser um inquérito “com um objeto mais vasto”, a PJM, que tinha iniciado a investigação sozinha, passa a ter a companhia dos procuradores do Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP) e da Unidade Nacional de Contra-Terrorismo (UNCT) da PJ.

8 de julho

A manchete do Expresso de 8 de julho espelha as várias pistas que segue a investigação. Nessa altura, uma das teses mais fortes era a de que o roubo tinha sido encomendado por mercenários portugueses (muitos deles estiveram nas forças especiais, como os comandos, paraquedistas, rangers ou fuzileiros) e atuam no estrangeiro por conta própria.

Alguns dos clientes destes ‘contractors’ são os senhores da guerra do Sahel, grupos separatistas corsos ou máfias europeias associadas a carrinhas de valores. A PJ e a PJM não têm dúvidas de que houve inside job. Uma tese inicial, espelhada no comunicado da PGR, parecia começar a cair por terra: de que o assalto tinha sido obra de forças jiadistas.

11 de julho

Neste dia, à saída de uma reunião com António Costa, que entretanto regressara de férias, o general Pina Monteiro afirma que os lança-granadas foguetes que foram roubados provavelmente não teriam probabilidade de funcionar com eficácia, porque estavam selecionados para serem abatidos.

Voltou ao assunto duas semanas depois, na Comissão de Defesa Nacional, esclarecendo que parte do material que foi alvo de furto estava sem condições de ser usado de forma eficaz mas que não se encontrava obsoleto. E que se fosse reparado continuava a ser perigoso. “Nunca fiz uma única referência a todo o material”, frisou, depois de acusações da oposição de encenação política para controlo de danos.

26 de julho

A secretária-geral do Sistema de Segurança Interna, Helena Fazenda, afirma na Comissão de Defesa Nacional que não foi avisada atempadamente pelo Exército do roubo.

Na audição da mesma Comissão Parlamentar de Defesa, realizada um mês após o assalto, Helena Fazenda, a secretária-geral do Sistema de Segurança Interna (SSI), garante que não foi avisada atempadamente pelo Exército e só veio a saber do roubo através da comunicação social. Daí só ter reunido a Unidade de Coordenação Antiterrorista (UCAT) - organismo dirigido por Fazenda que coordena a informação sobre investigação e combate ao terrorismo - quase 48 horas depois do desaparecimento das armas de guerra.

27 de julho

Também no parlamento, Júlio Pereira diz praticamente o mesmo que Helena Fazenda. E que soube tudo pelos jornais.

30 de julho

O comandante supremo das forças armadas, Marcelo Rebelo de Sousa, não desdramatiza o assalto, numa entrevista ao “Diário de Notícias”, publicada a 30 de julho. “É em si mesmo um acontecimento grave”, afirmou. E lembrou que logo nos primeiros momentos a seguir ao desaparecimento das armas, altura em que visitou a base de Tancos, disse ter exigido uma investigação cabal “de alto a baixo doa a quem doer”. Um mês depois viria a mostrar-se preocupado com o tempo da investigação.

No final do verão, os investigadores da PJ e da PJM tinham feito mais de 50 inquirições e uma lista com mais de cinco suspeitos que estariam a ser monitorizados e se encontrariam em Portugal. Entre eles havia civis e militares.

Nessa altura, a Judiciária pediu ajuda às autoridades espanholas para encontrar alguma pista sobre a compra do saca-cilindros, um equipamento que não se vende em Portugal mas sim naquele país, e também para fazer uma busca ao sistema de portagens e vigilâncias nas autoestradas para tirar a limpo se algum veículo suspeito terá circulado no país vizinho.

10 de setembro

Logo após ter recebido as conclusões dos inquéritos dos diversos ramos das Forças Armadas e da Inspeção-Geral da Defesa Nacional, o ministro da Defesa, Azeredo Lopes, deu uma entrevista ao Diário de Notícias/TSF, a 10 de setembro, em que lançaria uma frase polémica. “No limite, pode não ter havido furto nenhum. Como não temos prova visual nem testemunhal, nem confissão, por absurdo podemos admitir que o material já não existisse e que tivesse sido anunciado... e isto não pode acontecer.” Durante a entrevista fez outras declarações fortes: “Sem querer estar a fazer humor com isso, um civil que queira utilizar um sistema LAW obsoleto arrisca-se a que lhe expluda nas mãos”, ou ainda “parece que estamos a falar de filmes do Rambo”.

18 de setembro

Azeredo Lopes volta a marcar a agenda, agora no Parlamento, onde anuncia que o Exército abriu três processos disciplinares e que o esvaziamento dos paióis de Tancos começou no dia 14 de setembro, com a colaboração da PSP e da GNR.

Os processos internos foram avançados contra três militares de baixas patentes que faziam a vigilância ao perímetro em Tancos: um tenente, um sargento e um praça que pertencem ao regimento de engenharia 1 (uma das cinco unidades que integram a base).

Azeredo Lopes anuncia ainda um conjunto de medidas para reforçar as condições de segurança das instalações de armazenamento de material militar sensível, na sequência do furto de Tancos.

Três dias antes, o Expresso revelou que Rovisco Duarte fez um despacho para alterar e reforçar as medidas de segurança aos paióis a 16 de setembro de 2016. Uma ordem que nunca foi levada a cabo, tendo ficado formalmente por assinar durante vários meses, mesmo após o assalto àquela unidade.

18 de outubro

Algures de uma cabina telefónica da Margem Sul, um homem ligou para o piquete da PJM a anunciar que havia um conjunto de caixas com granadas deixadas num terreno baldio na Chamusca (distrito de Santarém), dando indicações precisas sobre a sua localização. Eram 3h de 18 de outubro.

Pouco tempo depois, os homens da PJM e uma equipa da GNR de Loulé, que se encontrava na zona a dar apoio à Judiciária militar num outro processo, deram com os caixotes. Nessa noite chovia torrencialmente e a visibilidade era reduzida e ninguém quis arriscar mexer no material até chegar o laboratório da PJM e a equipa de engenharia do Exército especializada em desativar explosivos, que se apresentou no local pelas 7h. O material foi então transportado para a base militar de Santa Margarida, ali perto, e só depois aberto.

Terá sido em Santa Margarida que os militares se aperceberam que tinham de volta o armamento roubado em Tancos. Os ladrões só não devolveram as 1450 munições, material com um escoamento mais fácil para o mercado negro. Mas foi detetada uma caixa que não constava no inventário do material roubado, que continha petardos. O Exército justificaria mais tarde que a “ligeira discrepância” era perfeitamente compreensível pelo facto de o material não ter sido utilizado na instrução dos soldados, apesar de registada a sua saída. António Costa deu os parabéns à PJM e à GNR por encontrarem o material de guerra.

Quem não gostou da história foi a Polícia Judiciária, que lidera a investigação ao caso. A equipa da UNCT só foi avisada a meio da manhã do resgate das armas através do procuradores do MP e pelos investigadores da PJM. A tensão entre as duas corporações atingiu o seu ponto alto com este episódio, reforçando as desconfianças mútuas iniciadas desde o momento zero da investigação. A PJ acusou a PJM de traição, a PJM garante que não sabia que ia encontrar as armas de Tancos antes de se deslocar para a Chamusca.

Quando a brigada da PJ chegou ao campo militar de Santa Margarida na manhã de 18 de outubro foi impedida de entrar. Os inspetores ficaram à porta entre o meio-dia e as 17h e só puderam aceder às instalações militares depois de apresentarem um mandado judicial, como foi exigido pelo Exército. Uma fonte próxima do general Rovisco Duarte garante que o CEME não proibiu o acesso e até facilitou a entrada na base, sendo que o código de justiça militar apenas permite à PJM o acesso irrestrito a áreas do Exército. Uma tese que não terá convencido os inspetores.

25 de outubro

Uma semana depois do resgate das armas e das polémicas públicas entre polícias, Ferro Rodrigues, o presidente da Assembleia da República, dá uma entrevista à revista “Visão” em que discorre sobre este dossiê. Não tem dúvidas em adjetivar Tancos como um caso “grave”, considera que teve aspetos “altamente cómicos”, mas “vai ter de se apurar quem promoveu, realmente, esta situação e quem ganhou com ela”.

21 outubro

No final de novembro, o CEME é ouvido à porta fechada na Comissão Parlamentar de Defesa Nacional. O teor da conversa de três horas e meia não foi tornado público. O aspeto mais picante desse dia na Assembleia da República foi no entanto a revelação por parte de Marco António Costa, o presidente da Comissão, de que vários documentos classificados pelo Exército como confidenciais – que dizem respeito à averiguação interna ordenada pelo ramo – se encontravam fechados em envelopes dentro de um cofre no Parlamento, à guarda do secretário-geral da Assembleia da República. Para garantir que a informação não transparece para a comunicação social, os deputados só podem aceder aos documentos mediante um pedido expresso.

22 de novembro

“Hoje temos todo esse material militar devidamente resguardado em paióis que oferecem toda a segurança e, portanto, em condições de não se voltarem a repetir as situações que ocorreram em Tancos. Ao todo, foram transferidas 1100 toneladas de armamento condicionados em mil paletes de Tancos para outros paióis espalhados pelo país no apelidado “Plano Troia”, operação organizada pelo Exército para retirar todo o material militar que se encontrava nos 19 paióis de Tancos. O general Rovisco Duarte tinha já garantido que “não fazia sentido manter os paióis de Tancos”, admitindo que ao longo dos anos houve “erros estruturais e erros sistémicos” em relação à segurança daquelas instalações militares. "Resta-nos agora aguardar que a Justiça conclua o seu trabalho de investigação sobre essa ocorrência”, declarou António Costa a 22 de novembro no final da curta visita ao Depósito de Munições da NATO, situado em Fernão Ferro (Seixal).

Dois anos depois do assalto, o caso ainda vai a meio. Haverá luz ao fundo de Tancos?


Créditos

TextoHugo Franco FotografiaJoão Carlos Santos, Nuno Botelho, Tiago Miranda, José Carlos Carvalho/Visão, Lusa IlustraçãoJoão Carlos Santos InfografiaJaime Figueiredo Web DesignTiago Pereira Santos Web DeveloperMaria Romero Coordenação editorialJoana Beleza e Germano Oliveira DirecçãoJoão Vieira Pereira
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