Debute O líder do PCP foi manchete do Expresso há 39 anos

A democracia portuguesa ainda tinha um Governo Provisório, o VI, quando o 'camarada' Jerónimo de Sousa, operário metalúrgico e dirigente sindical que se filiara no PCP em 1974, se estreia em grande na primeira página do Expresso.

PDF "Poucas surpresas nas listas para as Legislativas", clique na imagem para ler o artigo no pdf da página do Expresso n.º175 de 6 de março de 1976

O título da manchete de 6 de março de 1976 não o referia, mostrando uma titulação que haveria de mudar muito ao longo das quatro décadas de vida deste jornal: "Poucas surpresas nas listas para as Legislativas", dizia a manchete do jovem jornal com três anos de vida. O nome de Jerónimo surgia no texto como candidato do Partido Comunista pelo círculo de Lisboa para as primeiras eleições legislativas que se iriam realizar a 25 de abril desse ano.

Acresce dizer que o 25 de Abril desse ano iria ser também o Dia de Portugal, de acordo com um despacho governamental de 12 de fevereiro. Um dia em cheio, numa época em que a democracia se consolidava todos os dias. O Expresso era dirigido pelo seu fundador Francisco Pinto Balsemão, Otelo Saraiva de Carvalho tinha sido libertado da cadeia de Santarém a 3 de março, e a embaixada de Cuba em Lisboa destruída por um atentado bombista que causou dois mortos, a 22 de abril, três dias antes das eleições legislativas em que o atual secretário-geral do PS, António Costa, não votou. Não o fez por ser abstencionista ou ter ido para a praia, mas porque não tinha idade para o fazer.

Nascido a 17 de julho de 1961, António Costa era muito jovem quando ingressou na Juventude Socialista. A 14 de outubro de 1978, com a assertividade contestária dos 17 anos, fazia a sua estreia num direito de resposta publicado na primeira página do Expresso. Em co-autoria com António Calado, enviou uma carta ao diretor do jornal que ainda era Francisco Pinto Balsemão, dizendo que "ao abrigo do direito de resposta" exigia que o jornal publicasse um "esclarecimento nos termos do artº 16 da Lei de Imprensa".

PDF "Carta Aberta contra a direcção da JS recolhe mais assinaturas pelo país", clique na imagem para ler o artigo no pdf da página do Expresso n.º311 de 14 de outubro de 1978

Costa pertencia então ao secretariado executivo da Federação da Área Urbana de Lisboa da Juventude Socialista (JS). A organização estava em plena campanha para o seu III Congresso Nacional que iria realizar-se em Tróia entre 1 e 3 de dezembro. José Leitão [que duas décadas depois exerceu o cargo de Alto Comissário para a Imigração e Minorias Étnicas] foi eleito secretário-geral da JS, o atual Presidente do PS Carlos César era nº 3 da Comissão Nacional, e Costa - que ainda estava no liceu - faria a sua estreia no Secretariado Nacional da JS no ano em que o FMI interveio em Portugal pela primeira vez.

O apelido Passos Coelho surge pela primeira vez no suplemento Expresso Regiões de 17 de julho de 1982, cuja direção era então assegurada pelo diretor interino, Augusto de Carvalho. Balsemão deixou formalmente a direção do jornal em janeiro de 1981 para assumir a chefia do Executivo.

PDF "deverá continuar a ser presidida por Passos Coelho...", clique na imagem para ler o artigo sobre o pai do líder do PSD, no pdf da página do Expresso n.º507 de 17 de julho de 1982

Marcelo Rebelo de Sousa, que já assegurava a direção interina há um ano [a partir do momento em que Balsemão assumiu o cargo de ministro de Estado Adjunto do PM], passou a diretor do Expresso; em setembro desse ano saiu para o Governo e o subdiretor Augusto de Carvalho assumiu interinamente a direção do jornal.

PDF "JSD: dirigentes divididos", clique na imagem para ler o artigo no pdf da página do Expresso n.º757 de 1 de maio de 1987

Três dias antes de o suplemento Expresso Regiões escrever que a Comissão Distrital do PSD de Vila Real "deverá continuar a ser presidida por Passos Coelho, na sequência do adiamento (por falta de candidaturas) da eleição para aquele órgão", a Assembleia da República aprovava a extinção do Conselho da Revolução com os votos favoráveis do PSD, PS, CDS, PPM e ASDI, abstenções da UEDS, e votos contra do PCP e do MDP/CDE. Só que esse Passos Coelho da Distrital de Vila Real é o médico António Passos Coelho, pai de Pedro Passos Coelho,
o atual líder do PSD.

Pedro Passos Coelho aparece pela primeira vez no Expresso na edição do 1º de maio de 1987, que chegou às bancas numa sexta-feira (e não no sábado como acontece habitualmente) por causa do feriado do Dia do Trabalhador. Na página 4 do 1º Caderno do Expresso, dirigido por José António Saraiva, ficamos a saber que Passos Coelho filho, então com 22 anos, iria apoiar a "recandidatura de Pedro Vinha" para a Distrital do Porto da Juventude Social Democrata, numa altura em que a liderança nacional da JSD estava a cargo do eurodeputado Carlos Coelho.

Na edição de 10 de junho de 1995, feriado e Dia de Portugal [o 25 de Abril teve uma vida curta como Dia de Portugal], "a jovem advogada Heloísa Apolónia" surgia nas listas do partido "Os Verdes" como candidata às eleições legislativas de 1 de outubro, que haveriam de ser ganhas pelo PS de António Guterres, pondo fim a um longo ciclo governação cavaquista.

PDF "O triunfo da nova geração Carvalhas", clique na imagem para ler o artigo no pdf da página do Expresso n.º1180 de 10 de junho de 1995

O título desta notícia da página 4 apresenta Heloísa Apolónia, que tinha 26 anos, com um dos trunfos "da nova geração de Carvalhas" (Carlos Carvalhos antecedeu Jerónimo de Sousa como secretário-geral do PCP).

Ao contrário de Passos, Jerónimo, Heloísa e Costa, a estreia no Expresso de Catarina Martins, porta-voz do Bloco de Esquerda, deve-se ao teatro e não à intervenção política. Catarina tinha 23 anos quando a 19 de outubro de 1996 o 'Cartaz', suplemento cultural deste jornal, então dirigido por José António Saraiva, noticia quatro peças que vão estar em cena.

PDF "A cantora careca", clique na imagem para ler o artigo no pdf da página do Expresso n.º1251 de 19 de outubro de 1996

O primeiro texto desta coluna de breves tem como título "A cantora careca de Ionesco". Aí se diz que se trata de uma "revisitação de uma das mais importantes [peças] do que se convencionou chamar 'teatro do absurdo' com encenação, cenografia e adereços" do precocemente desaparecido João Paulo Seara Cardoso, importante marionetista português. João Paulo que fez parte do grupo fundador do Teatro de Marionetas do Porto, trabalhou como encenador convidado do grupo Visões Úteis do Porto. Catarina Martins era uma das atrizes desta trupe teatral que faria a sua estreia no auditório da Culturgest, em Lisboa, a 24 de outubro.

Terminamos esta viagem pelo arquivo do Expresso com o ralhete que o precoce Paulo Portas levou do seu primeiro diretor. O líder do CDS-PP, que foi diretor do semanário "O Independente" [jornal que azedou as sextas-feiras de muitos políticos nas décadas de 1980 e 1990], fez a sua estreia no jornalismo quando tinha 15 anos como estagiário na redação do semanário "O Tempo", fundado em maio de 1975, no auge do processo revolucinário que Portugal viveu depois da Revolução dos Cravos.

Um ano mais novo do que António Costa e dois anos mais velho do que Passos Coelho, Portas inscreveu-se na Juventude Social Democrata em 1975, e entrou na redação de "O Tempo" em 1977. Quatro anos depois, em junho de 1981, a velha Revista do Expresso, ainda em papel de jornal, publicava na sua coluna humorística "Lusitânia Expresso" [feita pelo jornalista Pedro d'Anunciação] uma crónica intitulada "Mercenários contra o embaixador". Os mercenários eram os jornalistas de "O Tempo" que tinham faltado às festas de aniversário do semanário. Nuno Rocha, o diretor, ficou zangado com a atitude relaxada dos seus colaboradores e fez uma nota interna que o Expresso, há 33 anos, transcreveu na íntegra.

PDF "Mercenários contra o 'embaixador'", clique na imagem para ler o artigo no pdf da página do Expresso n.º 452 de 27 de junho de 1981

Agora, vamos direitos ao trecho do raspanete em que Paulo Portas, então com 18 anos, é uma das vítimas: "O diretor manifesta a sua grande mágoa por não ter visto em Santarém os redatores Pereira de Almeida, Alves Fernandes, Vítor Serra, Margarida Viegas, Paulo Portas, Vítor Camacho".

Nuno Rocha que se refere a si próprio no plural majestático diz ainda que "o diretor não tem palavras para exprimir a sua tristeza por estas ausências incompreensíveis" para um homem que deu tudo a "O Tempo", sacrificando a sua carreira, "já podia ter ingressado na política ou ter procurado lugar numa Embaixada (...)".

Três décadas depois o Expresso pode atestar que Nuno Rocha não tinha razão para tanta repreensão. Ele não chegou a ter o tal lugar numa embaixada, mas o seu estagiário Portas chefiou o Ministério dos Negócios Estrangeiros.

Artigo corrigido às 17 horas no que toca à informação sobre António Passos Coelho